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Crônica
minha ("Usos e abusos") provocou uma enxurrada de e-mails no meu
computador. Ensinaram-me macetes para selecionar aquilo que me interessa
receber. Mas a maioria das mensagens atribuía-me orgulho, falta
de educação etc.
Volto ao assunto, tentando fazer aquilo que em Portugal chamam de
"clarificar" a questão. Uso o computador e só me utilizo da Internet
em função do trabalho.
Como entretenimento, lazer, recurso para me inteirar com o mundo,
como comunicação pessoal, prefiro outros meios. Fico assombrado
com a solidão dos maníacos que descolam amigos, namoradas, confidentes,
informantes e bate-papos virtuais, mas são incapazes de dar um bom-dia
ao vizinho. E, em alguns casos, nem dão bom-dia aos pais e irmãos.
É fácil a relação com o mundo virtual, que pode desaparecer com
um toque na tecla do deletar. O difícil, o que tem estragado o mundo,
que sangra nas guerras, na violência urbana, no vale-tudo pelo mercado
de trabalho é justamente essa falta de comunicação, de solidariedade
entre dois seres humanos que habitam a mesma casa, a mesma rua,
a mesma escola, o mesmo trabalho.
Muito cômodo acessar um sujeito na Tailândia ou uma jovem em Porto
Alegre e trocar confidências, discutir cinema ou música, reclamar
da repressão da família, da escola ou da sociedade.
O sujeito fecha o computador, sai para alugar um vídeo, dar uma
volta de bicicleta. Abre o elevador. O vizinho do andar de cima
está descendo. Não o cumprimenta, gostaria de estar sozinho no elevador,
que, afinal, é de todos. Mas no andar de baixo entra uma vizinha
com um carrinho de feira. Amarra a cara. Está perdendo tempo, já
podia estar na rua.
Quando chega ao térreo, sai furioso, considera-se insultado pela demora e pelos vizinhos que simplesmente existem em carne e osso.
E não podem ser deletados, porque a polícia não deixa.
Leia colunas anteriores
25/07/2000 - Usos e Abusos
18/07/2000 - Seja Feita a Luz
11/07/2000
- O Demônio e a inflação
06/07/2000 - Lápis e papel
04/07/2000 - Minha doce secretária
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