|
Um
dos fatores que supostamente separa os brasileiros frequentadores
de Bariloche (ou "Barilóshi", como dizem os habitués) da Europa
seria o suposto preço elevado do velho mundo, o que levaria o turista
remediado a escolher pelas terras vizinhas ou Miami, aquele pedaço
da América Latina perturbado por meia dúzia de americanos perdidos.
Mas, aproveitando que a Flórida está interditada nos preparativos
do primeiro estágio da guerra civil entre democratas e republicanos
e na Argentina a coisa tá tão russa que eles dizem que a coisa não
tá mais russa, mas argentina, vale a pena repensar alguns preconceitos.
E vou contar a vocês que a Europa, em se sabendo usá-la, é uma pechincha.
Em Londres, que é a cidade mais cara do continente, há uma tática
prestes a ser patenteada por este que vos escreve que permite a
sobrevivência na terra da rainha com um pound por dia. Como ? Explico-me.
Comecemos pela razão pela qual você precisa da moedinha de um pound.
É para o transporte. Evite o metrô, que é claustrofóbico, fálico
e à prova de fraudes. A solução é o ônibus, os famosos double-deckers.
O caminho é ir pro andar de cima e lá ficar. Os cobradores de ônibus
daqui são velhos e/ou preguiçosos demais para subir ao segundo andar
e verificar se o sujeito tem ou não a passagem. E, mesmo quando
sobe, as boas maneiras inglesas ditam que ele não peça o ingresso
diretamente a cada pessoa. Só chega lá na ponta e grita: "Tickets
! Fares !". E, como já dizia aquele antigo ministro e atual presidenciável,
quem paga ágio é otário. O problema é que, vez que outra, vêm os
inspetores, então é bom você ter dinheiro pro ingresso, porque senão
a multa é de dez libras. Não que seja uma tragédia mas, nesse caso,
vai encurtar a sua viagem em dez dias, então não vale a pena.
Segundo item: comida. Isso é supérfluo. Na Inglaterra, ninguém come.
As vacas comeram comida inglesa e ficaram loucas. Cada vez que você
estiver com fome, vá até um típico restaurante inglês e peça para
ir à cozinha ver a preparação de um fish and chips, e te garanto
que você não come por três dias - sem falar nos pesadelos com o
mar de óleo, que vão te tirar o sono e fazer com que você não se
preocupe com acomodação.
Pra quem for pra outros lugares da Europa, onde a comida é boa,
a solução são os restaurantes chineses e indianos. Nos chineses,
diga que tem uma pé de rã no seu prato. Eles vão te dizer que é
exatamente o que você pediu, mas aí você roda a baiana, apega-se
ao nível superior da cultura ocidental, diz que o chef deve ser
da Mongólia e vai-se embora. No indiano, o negócio é fazer de conta
que se está morrendo sufocado com as pimentas e curry, e também
sair de fininho.
Solucionados os problemas de transporte e alimentação, falta apenas
o de acomodação. Se você não é que nem meus amigos folgados, que
pedem pra ficar em casa e trazem uma guaraná de presente como pagamento,
vai notar que os hotéis estão pela hora da morte. Pode tentar um
albergue, por uns vinte mangos, mas o incômodo de ter de tapar todos
os orifícios do corpo com algodão e esparadrapo durante a noite
não compensa. A solução clássica é comprar o Euro Pass e viajar
todas as noites entre Paris e Budapeste. Mas essa já tá manjada
e é um porre. Em tempos de mad cow disease, a melhor coisa que você
pode fazer é começar a mugir e espernear em pleno Piccadily Circus
ou Champs Elysées, que o pessoal te leva rapidinho prum hospital
ou pra prisão. Se for hospital, beleza; vá embora na manhã seguinte.
Se for prisão, não se aflija: é só ligar pro grande embaixador brasileiro
local e pedir caneco. Estarás assim cumprindo um dever cívico. Afinal,
a vida desses desocupados é tão monótona que um pouco de ação vai
até fazer bem ao nosso rechonchudo corpo diplomático. E bon voyage.
* * *
Pra quem vier a Londres e quiser gastar mais um pouco, vale a pena
conferir uma exposição chamada Impression, na National Gallery.
E uma peça chamada Madame Melville, com a maravilhosa Irene Jacob
e o fraquinho Macaulay Culkin a tiracolo.
Leia
colunas anteriores
06/12/2000 - O onipresente
03/12/2000 - É uma câmera
no seu banheiro?
26/11/2000 - Um animal social
19/11/2000 - Até
onde vamos ?
12/11/2000 - Muito a leste, e já
se chega ao oeste
|