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A
polêmica do momento na Espanha gira em torno da proposta do presidente
da Junta (governador) de Castilla-La Mancha, o socialista José Bono,
de publicar a lista dos condenados por maus tratos às mulheres.
Mesmo com a ressalva de que a lista só conteria os nomes daqueles
condenados em definitivo, juizes e promotores são contra.
Alegam que a publicação atenta contra a dignidade dos condenados (o
que significa reconhecer que mesmo condenados têm direito a tratamento
digno), estende a mancha às suas famílias, dificulta a reinserção
social dos condenados. Tudo somado, a pena acabaria sendo superior
à prevista no Código Penal.
Associações de mulheres, ao contrário, defendem a proposta, mesmo
reconhecendo que, por si só, ela não resolverá o problema.
A polêmica tem como pano de fundo os números, mais exatamente o de
mulheres mortas por seus maridos ou companheiros: foram 33 durante
todo o ano de 1997, 42 em 99 e 35 só no primeiro semestre deste ano.
O que, por sua vez, significa o fracasso de um certo "Plano de Ação
Contra a Violência Doméstica", lançado pelo governo conservador há
dois anos.
Mas há um caso concreto que tornou ainda mais acesa a polêmica. Na
terça-feira, foi levada à prisão a "Tani", a cigana Teresa Moreno
Maya, condenada a 14 anos por ter matado a tiros seu marido, em uma
"chabola" (versão espanhola, embora melhorada, das favelas brasileiras).
"Tani" apanhava do marido, alcoólatra, desde que se casou. Presa após
o crime, ficou em liberdade condicional, conseguiu emprego de faxineira
e, mesmo com o magro salário, acabou alugando um pequeno canto para
morar com os quatro filhos. Estava começando "a ser gente", disse
ela ao jornal "El Mundo".
Por isso mesmo, houve uma formidável mobilização social e de entidades
femininas para que "Tani" não ficasse presa e, assim, pudesse continuar
a "ser gente" e a cuidar dos filhos, graças ou a um indulto ou ao
regime de prisão aberta.
Conto esta história toda apenas para mostrar o abismo que existe entre
a Espanha, economicamente do tamanho do Brasil, e um certo país tropical
em que uma parcela importante do público dá o aval a quem cunhou a
expressão "estupra, mas não mata".
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