Estado e partidos são colonialistas, diz quilombola Antônio Bispo

Para intelectual, direita e esquerda convergem em políticas equivocadas e pensamento decolonial é insuficiente

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Eduardo Sombini
Eduardo Sombini

Doutor em geografia pela Unicamp, é repórter da Ilustríssima

O pensador quilombola Antônio Bispo dos Santos —ou tradutor, como ele costuma se definir— buscou no Gênesis o documento de fundação da humanidade eurocristã.

Para ele, ao apartar os humanos da natureza e criar a imagem de um Deus terrorista, a Bíblia deu origem à cosmofobia que nos governa, um regime monoteísta em que só cabem uma verdade e um modo de existir no mundo.

Essa impossibilidade de relacionamento orgânico com outras vidas, ele diz, é o pilar do colonialismo e explica a perseguição aos povos tradicionais, que se veem como criaturas da natureza e não têm a pretensão de se tornar criadores de um mundo sintético.

Convidado do episódio desta semana, Bispo apresenta, em "A Terra Dá, a Terra Quer" (Ubu), sua crítica ao pensamento decolonial —que, para ele, oferece no máximo um pacto de não agressão aos povos que sofrem tentativas de colonização— e explica por que considera que é preciso ir além e ser contracolonial.

Antônio Bispo dos Santos, autor de 'A Terra Dá, a Terra Quer' - Alexia Melo/Divulgação

Bispo também defende que o Estado, os partidos políticos e os sindicatos carregam o colonialismo em suas estruturas e que, por isso, os governos reproduzem essa lógica, sejam de direita, sejam de esquerda.

Se o colonialismo continua e eu vou desmanchar o colonialismo, eu vou morrer cansado: eles fazendo, eu desmanchando, eles fazendo, eu desmanchando. É isso que os decolonialistas estão fazendo. Eles estão desmanchando, os caras continuam fazendo. Nós, contracolonialistas, que temos uma trajetória —os quilombos, as aldeias, as comunidades tradicionais— queremos bloquear o colonialismo e estabelecer uma fronteira. "Até aqui, vocês vieram, parem, não venham mais. Para lá nós não vamos, para cá vocês não vêm". Isso é contracolonizar. Você para o sistema. Não precisa matar os colonialistas, mas precisa adestrar e curar essas pessoas da cosmofobia porque, curados da cosmofobia, eles vão ser menos violentos, eles vão ter menos medo e dá para se conviver

Antônio Bispo dos Santos

pensador quilombola e autor de 'A Terra Dá, a Terra Quer'

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O podcast entrevista, a cada duas semanas, autores de livros de não ficção e intelectuais para discutir suas obras e seus temas de pesquisa.

Já participaram do Ilustríssima Conversa Luiz Marques, que discutiu por que este decênio é decisivo para lidar com a catástrofe climática, Bela Gil, que defendeu a remuneração do trabalho realizado por donas de casa, Javier Montes, escritor espanhol que se debruçou sobre a vida da dançarina e naturista Luz del Fuego, Paulo Arantes, professor de filosofia da USP para quem Lula terá sucesso se frear a extrema direita, Eliane Brum e Maria Rita Kehl, convidadas para o episódio comemorativo dos cinco anos do podcast, João Moreira Salles, autor de um livro sobre o modelo predatório de ocupação da Amazônia, Ailton Krenak, que abordou a tragédia do povo yanomami, Gabriela Lotta e Pedro Abramovay, que discutiram os papéis de burocratas e políticos em uma democracia, Felipe Loureiro, que analisou as relações entre EUA e Rússia depois do início da Guerra da Ucrânia, Denise Ferreira da Silva, para quem a violência racial é um pilar da modernidade, entre outros convidados.

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