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EUA querem que Brasil reduza vistos humanitários a haitianos para conter migração

Americanos avaliam que rigor maior tende a diminuir fluxo de migrantes na fronteira com o México

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Brasília

Para tentar conter a atual crise migratória nos Estados Unidos, o governo de Joe Biden passou a defender que o Brasil aumente o rigor na concessão de vistos humanitários e de reunião familiar para haitianos.

Segundo interlocutores, Washington considera que uma eventual redução no número desses vistos tende a diminuir o fluxo de cidadãos do Haiti que cruzam as Américas rumo à fronteira sul dos EUA, já que parte dos detidos tentando entrar de maneira irregular no território americano inicia a jornada no Brasil.

A avaliação é que o fortalecimento de controles migratórios no Brasil e em outras nações latino-americanas, caso do Chile, também apontado como origem dos haitianos, deve desencorajar pessoas que planejam ingressar nesses países apenas com o objetivo de tentar migrar para os EUA pouco depois.

Migrantes do Haiti e de outros países da América Central em caravana que está cruzando o México em direção à fronteira sul dos EUA - Jacob Garcia - 25.out.21/Reuters

A preocupação de Washington foi manifestada, de forma genérica, pelo secretário de Estado americano, Antony Blinken, durante reunião realizada na semana passada em Bogotá, na Colômbia. Ele não citou o Brasil na ocasião, mas pediu a cooperação de todos os países da região no enfrentamento da atual crise.

"Nós temos de fortalecer o controle das fronteiras, por exemplo, por meio da exigência de vistos e do controle meticuloso da entrada em casos em que a dispensa de permissões estimula, de forma não intencional, a migração irregular", disse. "Nós temos de melhorar os processos de asilo para que as pessoas que têm apelos [por refúgio] válidos possam ser ouvidas rapidamente."

A crise foi evidenciada na semana passada, quando os dados do Serviço de Alfândegas e Proteção das Fronteiras (CBP, na sigla em inglês) relativos ao ano fiscal de 2021, encerrado em setembro, foram divulgados, mostrando o recorde de mais de 1,7 milhão de detenções na fronteira com o México.

A cooperação bilateral para enfrentar a situação também foi discutida numa visita a Brasília, na semana passada, da secretária-adjunta de Assuntos Internacionais do Departamento de Segurança Nacional dos EUA, Serena Hoy. Procurado, o Itamaraty negou que os americanos tenham manifestado preocupação com o número de vistos humanitários concedidos pelo Brasil a cidadãos haitianos.

"O governo brasileiro considera que os vistos para acolhida humanitária a cidadãos do Haiti são concedidos com o máximo rigor, em conformidade com os parâmetros estabelecidos pela portaria interministerial número 13, de 2020", afirmou o ministério, em nota.

A embaixada dos EUA, por sua vez, argumentou que "ajudar a conter o fluxo de indivíduos que procuram utilizar países terceiros como ponto de partida para fazer uma viagem ilegal é um aspecto importante" dos esforços para conter a onda de migração irregular. "A atual situação migratória sem precedentes é um desafio regional que exige que todos nós encontremos novas soluções e novas formas de cooperação, no âmbito das leis de cada país e dos nossos compromissos internacionais."

O Brasil emitiu neste ano cerca de 3.300 vistos de acolhida humanitária para haitianos e 800 de reunião familiar. Em 2018, foram 3.000 vistos humanitários, número que subiu para aproximadamente 5.500 por ano em 2019 e 2020. A comunidade haitiana no país é de 120 mil pessoas, segundo interlocutores no governo. Esse tipo de acolhida é similar à que foi ofertada recentemente a cidadãos do Afeganistão.

Haitianos estão entre as principais nacionalidades de detidos na fronteira dos EUA. Do total de barrados no ano fiscal de 2021 —1,7 milhão—, 608 mil eram mexicanos e, na sequência, num grupo de 367 mil apreendidos de "outras nacionalidades", segundo o CBP, estão cidadãos do país caribenho e brasileiros, entre outros.

O número criou problemas para Biden. Primeiro, com as cenas de milhares de migrantes amontoados em um acampamento sob uma ponte no Texas e, depois, de agentes de fronteira ameaçando pessoas com rédeas de cavalos. O democrata acelerou as deportações, mas enfrentou críticas pelas devoluções feitas ao país mais pobre das Américas —que enfrenta também grave crise política e econômica.

No final de setembro, Blinken pediu ao chanceler brasileiro, Carlos França, que o Brasil aceitasse receber haitianos que tenham algum vínculo com o país —seja um registro nacional de estrangeiro válido ou filhos brasileiros. Pessoas nessas condições não têm impedimento para ingressar no país.

Os americanos também sondaram a possibilidade de ampliar as hipóteses em que cidadãos do Haiti deportados seriam levados ao Brasil, mas o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) rejeitou a proposta.

De acordo com interlocutores, a atual prioridade do Itamaraty no tema é dar assistência a crianças nascidas no Brasil que foram deportadas para o Haiti por não terem documentos que comprovassem a nacionalidade. Elas foram detidas junto aos pais ao tentar atravessar a fronteira pelo México.

Autoridades brasileiras estimam que haja cerca de 80 crianças brasileiras de pais haitianos na nação caribenha. O atual trabalho consiste em mapear esses casos e garantir que as crianças e seus pais tenham os documentos necessários caso queiram voltar ao Brasil.

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