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Chile debate 'planos B' em meio a incerteza sobre resultado de plebiscito

Rejeição a nova Constituição lidera pesquisas, e esquerda e direita discutem ações futuras

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Santiago

Mal deixou o cargo de Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, a ex-presidente do Chile Michelle Bachelet mostrou que entraria de cabeça na campanha pela aprovação da nova Constituição do país no plebiscito a ser realizado no próximo domingo (4).

Em vídeo divulgado nas redes sociais na noite desta quarta (31) Bachelet visita "de surpresa", a casa de uma mulher, que toma lanche com as amigas enquanto debatem o novo texto. "Vocês sabiam que a Constituição atual não diz nada sobre as mulheres e que a de agora [proposta] tem 35 artigos só sobre esse tema?", pergunta a ex-presidente, emendando: "Essa nova Constituição não vai resolver tudo sozinha, mas é um ponto de partida. Vamos ter de fazer ajustes, para que a partir daí possamos avançar".

Apoiadores do 'sim' em último ato de campanha antes do plebiscito, em Santiago - Ivan Alvarado - 1º.set.22/Reuters

A ideia de defender um "aprovo, mas com mudanças", como sugere Bachelet, ou "se houver reprovação, voltemos ao princípio" é um compromisso da aliança governista e de boa parte dos partidos de centro e centro-direita caso a rejeição saia vencedora na votação. Uma carta suprapartidária teve o endosso do presidente Gabriel Boric.

O consenso é também vocalizado por lideranças políticas do governo e da oposição, que destacam os contundentes 80% dos votos favoráveis a acabar com a Carta atual no referendo de 2020.

Essa espécie de plano B é discutida porque as pesquisas têm mostrado vantagem para a rejeição do texto: o não conta com 46% das intenções de voto, contra 37% do sim —mas 17% dos chilenos se dizem indecisos, segundo o instituto Cadem. As regras da consulta não permitem a divulgação de novos números até o dia da votação, o que aumenta o clima de suspense e as negociações de bastidores. O voto será obrigatório no pleito.

"Uma derrota no domingo não será uma derrota da democracia. Ao contrário, será seu fortalecimento, porque é a democracia que vai nos manter no compromisso de redigir uma nova Carta", diz o advogado Luis Cordero, diretor da ONG Espaço Público. "A partir do momento em que há um acordo de que esse processo precisa ir até o fim, estamos num caminho positivo —ainda que isso signifique certamente uma derrota para Boric."

Para o advogado constitucionalista Tomás Jordán, que preside o Observatório Nova Constituição, uma iniciativa de universidades chilenas, ambos os cenários preveem processos longos e dependem muito do tipo de vitória que terá a opção vencedora.

"Se o Aprovo ganhar com ampla vantagem, a implementação será mais simples: o Congresso participará da regulamentação de leis, mas em coisas pontuais. Se ganhar por pouco, haverá a necessidade de negociar mais, porque o Parlamento é mais moderado que a Constituinte —então deve ampliar a pressão, de modo mais contundente, para tornar alguns pontos menos radicais."

Mesmo no caso de uma vitória firme do sim, a nova Constituição não começa a valer imediatamente. Quase todas as legislações deverão ser regulamentadas pelo Congresso. Isso esticará o processo, segundo analistas ouvidos pela Folha, a pelo menos mais dois mandatos presidenciais. Até lá, seguirá vigente a atual Carta, promulgada durante a ditadura de Augusto Pinochet.

No caso mais provável, de se manterem os números das pesquisas e o Rejeito sair vencedor, começa um caminho mais espinhoso. O governo e o Congresso terão duas semanas para fechar um acordo que defina se haverá uma nova Convenção Constitucional, qual será a redação, quando se dará uma nova votação e se ela passará por um plebiscito como esse. Uma nova eleição de legisladores, porém, só poderia ocorrer pelo menos 125 dias depois de domingo, segundo o Servel (autoridade eleitoral).

"Por parte da direita, há uma pressão para que haja mais participação do Congresso na redação da nova Carta, menos nomes independentes e representantes de comunidades indígenas —embora se concorde com a paridade de gênero. Já a esquerda pressiona para que se use o mesmo texto-base, para ganhar tempo e ter uma nova Carta antes dos 50 anos do golpe de Estado [setembro de 1973]", diz Jordán.

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