Descrição de chapéu Eleições 2022

Institutos dos EUA reavaliam metodologia para aprimorar pesquisas de intenção de voto

A menos de um mês das midterms, organizações buscam equilibrar peso de democratas e resistência de republicanos

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Washington

Os questionamentos ao trabalho de institutos de pesquisa, disparados no Brasil após o primeiro turno das eleições, com direito a ataques e manobras da base governista, são fenômeno já bem conhecido nos EUA.

O motivo é o mesmo: um descompasso entre o que indicam os levantamentos —que, de resto, não têm objetivo de acertar o resultado— e os números que saem das urnas.

Em 2016, os dados indicavam uma vitória inevitável da democrata Hillary Clinton, que acabou perdendo para o republicano Donald Trump. Em 2020, diziam que Joe Biden ganharia, mas com vantagem maior do que a que de fato teve —os institutos exageraram em 3,9 pontos percentuais a margem no voto popular nacional para o democrata e em 4,3 pontos nas pesquisas estaduais, para o Colégio Eleitoral.

Apoiadores de Donald Trump em evento de campanha de candidatos republicanos em Nevada - Justin Sullivan - 8.out.22/Getty Images/AFP

O assunto voltou ao debate público com a chegada, em menos de um mês, das eleições de meio de mandato –as midterms. Para defender a reputação e aprimorar seus resultados, institutos de pesquisa vêm tentando ajustar suas estimativas, de forma a evitar que imprensa e população voltem a atacá-los.

As organizações querem, por exemplo, evitar um enfoque desproporcional nas populações com nível escolar alto —considerado um dos possíveis deslizes em 2016. Tentam também ouvir mais republicanos alinhados a Trump. Essa parcela do eleitorado, tradicionalmente mais avessa a falar com pesquisadores, pode ter sido subestimada em 2020.

Se é suficiente, isso só vai ficar claro após o pleito. Analistas avaliam que o caminho é limitado, mesmo porque não está totalmente claro o que exatamente deu errado nas últimas eleições nem a melhor forma de balancear as discrepâncias.

Nas midterms de 8 de novembro, americanos votam para renovar todos os 435 assentos da Câmara e 35 das 100 cadeiras do Senado. Há também disputa para governador e outros cargos estaduais.

Desde a Segunda Guerra Mundial, o partido que controla a Casa Branca quase sempre perde terreno nesse pleito. Os democratas de Biden têm hoje 220 assentos na Câmara, uma mínima vantagem de oito assentos, e 50 no Senado, mais o voto de minerva concedido à vice-presidente Kamala Harris.

Diante da popularidade frágil do presidente, a expectativa era de que os republicanos reconquistassem ambas as Casas, mas alguns institutos têm indicado outro cenário. O site FiveThirtyEight, principal agregador de pesquisas, diz que os democratas têm 67% de chance de manter o controle do Senado.

O imbróglio fica mais claro quando se olha para disputas de maneira individual. Levantamentos indicam um pleito apertado para o Senado em Ohio, por exemplo, mas o estado é considerado hoje um bastião dos republicanos. Algo mudou ali —ou as pesquisas não estão totalmente ajustadas.

Mark Weaver, advogado especializado em lei eleitoral baseado em Ohio, acredita que os institutos podem estar subestimando o eleitorado republicano. Como no passado, diz, as pesquisas ouvem demasiadas pessoas com diploma universitário, mas a proporção da população com esse nível de estudo é de 29% no estado.

Isso importa porque pesquisadores acreditam que quem tem alto grau de escolaridade tende a votar em democratas. "Se queremos saber o que o povo pensa da política, temos que garantir que os dados reflitam aquilo que já sabemos sobre a população", afirma.

Outro problema, segundo Weaver, é que eleitores republicanos —em especial aqueles que votaram em Trump e aliados— têm sido cada vez mais resistentes à participação nesses levantamentos. "Eles aprenderam a fechar a boca quando alguém começa a discutir política", afirma, lembrando que parte da imprensa e do próprio governo os descreve como irracionais. "As pessoas mentem ou evitam falar com pesquisadores. Essa é uma questão sistêmica, que não dá para resolver mudando o método."

Fenômeno semelhante é aventado no Brasil com apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) —não por acaso, aliado de Trump.

Para sanar questões dessa seara, diversos institutos anunciaram revisões nos seus métodos. O Pew Research Center, por exemplo, disse em 2021 que estava modificando a composição dos grupos pesquisados. Setores específicos, como os democratas com alta escolaridade, foram reduzidos. Ao mesmo tempo, o instituto buscou maneiras de ouvir grupos menos representados, como pessoas de baixa renda.

Analistas sugerem ainda outras estratégias, como dar peso diferente a eleitores democratas e republicanos, para corrigir eventuais distorções. "Quando se amplia um campo desses, porém, cresce a margem de erro", diz Weaver. "É como quando você faz um xerox de uma foto e depois a amplia."

Para falar com os eleitores mais ariscos, uma solução é ouvi-los pela internet ou por correio em vez de por telefone, para atenuar sua desconfiança. O entendimento é que, falando com um pesquisador, o eleitor pode se sentir pressionado a dar uma resposta socialmente aceita.

O Instituto Marist, que faz levantamentos para veículos americanos como NPR e PBS, começou a abordar entrevistados via mensagem de texto nos últimos meses. "Ficou mais caro e mais difícil fazer pesquisas de intenção de voto", diz Lee Miringoff, diretor da entidade.

Patrick Murray, diretor de um centro de pesquisa na Universidade Monmouth, aponta outro desafio: as pesquisas tendem a afetar os eleitores. Nos EUA, ao contrário do Brasil, o voto é facultativo. Em 2016, quando parecia óbvio que Hillary derrotaria Trump, alguns democratas talvez tenham deixado de ir votar —e ela perdeu. "Isso é válido em especial quando se acha que o resultado já está decidido."

Ele defende os institutos, de toda forma. A insatisfação popular, afirma, tem a ver também com um equívoco sobre o que os pesquisadores fazem. "Pesquisas não são previsões inequívocas de resultado, mas um retrato de como se votaria naquela circunstância específica", explica Murray. "O problema não é pesquisas serem confiáveis ou não, mas nossas expectativas do que elas podem dizer."

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