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Nova York contraria regiões conservadoras e expande estudos raciais em escolas

Cidade-símbolo dos EUA anuncia currículo escolar focado em afroeducação, bem como em asiáticos e hispânicos

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Troy Closson
Nova York | The New York Times

A cidade de Nova York lançará um novo currículo de estudos afrocentrados que poderá ser usado em centenas de escolas. Ele faz parte de uma ação local para adotar aulas sobre raça e cultura.

Iniciativas desse tipo têm dividido drasticamente os distritos escolares dos Estados Unidos, de acordo com linhas políticas.

O currículo de estudos sociais afrocentrados será lançado em algumas salas de aula em setembro, antes de se expandir nas séries de ensino fundamental e médio.

duas pessoas levantam cartazes com os dizeres "black lives matter" (vidas negras importam). elas usam roupas de frio e o cartaz tampa seus rostos
Manifestantes seguram cartazes em apoio ao movimento Black Lives Matter em St Paul, cidade em Minnesota - Kerem Yucel - 24.fev.2022/AFP

Um currículo focado em asiático-americanos e originários das ilhas do Pacífico, usado em cerca de uma dúzia de escolas, também será expandido no sistema em 2024. Algumas instituições já tinham adotado um complemento curricular LGBTQIA+ para crianças da quarta série ao ensino médio no ano passado.

Mais de 40 estados adotaram ou aprovaram leis para restringir como são ensinadas as questões raciais. Recentemente, na Flórida, o governador Ron DeSantis proibiu a formação de uma nova classe do programa de colocação avançada [voltado para alunos do ensino médio que se preparam para a faculdade] em estudos afro-americanos.

Mas há outro movimento para expandir o ensino sobre raça, discriminação e sexualidade em alguns lugares de tendência esquerdista, marcando uma divisão cada vez maior no que os estudantes americanos aprendem sobre a história e a cultura do país nas escolas.

Connecticut, Illinois e Washington D.C. estão adicionando novos conteúdos sobre as experiências de pessoas negras. Em breve, a Califórnia também exigirá que os alunos façam um curso de estudos étnicos para se formarem no ensino médio.

Na cidade de Nova York, autoridades escolares disseram que, por enquanto, os professores serão incentivados, mas não obrigados, a adotar os currículos, embora legisladores estaduais tenham apresentado projetos de lei para tornar obrigatório o ensino da história asiático-americana e expandir a educação em história negra.

Ainda assim, a meta da cidade é muito menos ambiciosa do que a anunciada pelo ex-prefeito Bill de Blasio, em 2021, para incluir discussões sobre raça e cultura nas principais disciplinas.

A cidade estava prestes a lançar um projeto de US$ 202 milhões que reformularia os assuntos principais de matemática e artes em língua inglesa para incluir aulas e livros sobre as "histórias, idiomas e experiências" dos estudantes da cidade. A prefeitura teria exigido as aulas na maioria de suas escolas.

Entretanto, o plano encontrou alguma resistência na época, e a administração do prefeito Eric Adams logo abandonou o esforço, argumentando que uma revisão curricular em um sistema com mais de 1.500 escolas era simplesmente inviável. A situação ilustra os desafios de reformular como as identidades dos alunos são incluídas em sua educação, mesmo em lugares onde há mudanças em andamento.

no centro da fotografia, em meio a uma multidão, está Eric Adams, homem negro retinto que usa terno e um boné azul com a sigla NYPD (Departamento de Polícia de Nova York)
O atual prefeito de Nova Yokr, Eric Adams, no funeral do policial Adeed Fayaz, assassinado no Brooklyn - Spencer Platt - 09.fev.2023/Getty Images via AFP

Em Nova York, mais de quatro em cada cinco crianças são latinas, negras ou asiáticas, e muitos alunos e famílias se esforçam para se verem refletidos no que aprendem.

Alguns ainda estão exigindo mais da prefeitura. Em um protesto recente na escadaria da sede do Departamento de Educação em Manhattan, dezenas de adolescentes pediram um ensino mais intensivo da história negra e maior diversidade entre os educadores.

"Sinto que estou emperrada aprendendo sobre Frederick Douglass, Harriet Tubman e Martin Luther King Jr. repetidas vezes", disse Isabella Juma, 16, estudante do segundo ano no Queens que compareceu ao protesto. "Você acaba pensando que é onde sua história começou e terminou, o que não é verdade. Os negros americanos estão fazendo história todos os dias. Precisamos representar isso com precisão."

O reitor das escolas da cidade de Nova York, David C. Banks, tornou-se o líder do sistema meses após De Blasio anunciar seus planos de criar um novo currículo universal que teria aulas "rigorosas, inclusivas e afirmativas" e seria financiado com verbas federais de combate à pandemia.

Em seu cargo anterior como líder da Eagle Academy for Young Men, Banks adotou o que os educadores chamam de "ensino culturalmente responsivo", termo que muitos educadores usam para falar sobre aulas e práticas que consideram a raça, a cultura e a identidade dos alunos.

Mas a atual administração se afastou do plano curricular universal no início deste ano letivo, como foi noticiado pela organização Chalkbeat na época. Funcionários disseram que o plano não era realista para um vasto sistema onde as necessidades dos alunos diferem amplamente.

"Minha exposição aos currículos de estudos negros, em particular, foi o que ajudou a me moldar", disse Banks, acrescentando que "não é importante apenas para crianças negras. É importante para todos."

Autoridades escolares disseram que estão planejando desenvolver um currículo hispânico e latino futuramente.

Pesquisas sugerem que as abordagens de ensino que se concentram nas culturas e identidades dos alunos podem beneficiá-los. Nos currículos de terceira a oitava série mais usados na cidade em 2019, mais de 80% dos livros eram de autores brancos. Os escritores latinos estavam particularmente sub-representados, segundo uma análise. Cerca de 15% dos alunos das escolas públicas tradicionais da cidade são brancos e cerca de 40% são latinos.

O escopo mais limitado dos planos da prefeitura desapontou algumas famílias e ativistas. Matt Gonzales, que se dedica à justiça educacional no Metro Center da Universidade de Nova York, disse que, como ex-professor de matemática, costumava ver matemática e ciências como "os lugares mais interessantes para incorporar autores negros, pardos e outras figuras sub-representadas".

"Acho que o governo perdeu a oportunidade de ligar os pontos", disse ele. "Precisamos efetivamente transformar a abordagem curricular que temos e garantir que ela esteja enraizada desde o início na capacidade de resposta cultural".

O currículo asiático-americano atual inclui lições sobre direitos civis e imigração, e os alunos mais velhos também aprendem sobre xenofobia e cidadania. De acordo com os planos de estudos afrocentrados, os professores do jardim de infância discutiriam os conceitos de comunidades e culturas. Na quarta série, as crianças estudariam as migrações negras africanas e fariam estudos de caso sobre lugares como o Haiti ou antigas civilizações africanas. Os alunos mais velhos explorariam os movimentos pelos direitos políticos dos negros e questões econômicas, incluindo a construção de riqueza nas comunidades negras.

Cyania Augustin, 16, disse que gostaria de uma educação em história negra que colocasse menos ênfase "apenas nas partes em que fomos roubados ou ficamos em desvantagem".

Em um de seus cursos no primeiro ano da Bard High School Early College Queens, Cyania recentemente aprendeu sobre os Panteras Negras. Mas foi apresentada pela primeira vez ao grupo, bem como a algumas outras partes significativas da história negra, no TikTok. "Acho que isso é um problema."

Enquanto se esforça para participar mais das discussões em sala de aula, a estudante diz que é mais fácil quando o material é relevante para suas próprias experiências. "Se estamos aprendendo sobre uma poetisa que por acaso é negra, vou entrar na conversa", disse.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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