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José Vicente da Silva Filho

Teremos mais competência na gestão federal da segurança pública?

Omissão deve dar lugar a trabalho intensivo com estados e municípios

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José Vicente da Silva Filho

Coronel reformado da Polícia Militar, ex-secretário nacional de segurança pública, foi professor do Centro de Altos Estudos de Segurança da PM. É membro do conselho da Escola de Segurança Multidimensional da USP e mestre em psicologia social pela USP

Não dá mais para o governo federal lavar as mãos e jogar aos governadores a responsabilidade pelo controle da violência. Nos últimos 20 anos foram assassinados mais de 800 mil brasileiros, a metade deles jovens e, na maioria, pobres. O crime organizado tem tentáculos em todas as praças e instabiliza fronteiras até na Amazônia. Custos e perdas relacionadas à violência chegavam a 6% do PIB em 2019, segundo cálculos do Ipea e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública —hoje valores superiores a R$ 1,6 bilhão por dia.

O desafio número um que espera o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e seu novo secretário nacional da Segurança Pública, Mário Luiz Sarrubbo, é a violência letal —e ela não é ligada somente ao crime organizado. A nova gestão da Senasp deve avaliar e revisar os planos estaduais e municipais para a segurança pública, identificando os casos mais críticos, como áreas do Nordeste e da Amazônia. A reformulação de políticas e programas de recuperação dessas regiões, com atuação prioritária nas cidades mais violentas e grupos mais vulneráveis, deve ter inteligência desenhada para esses locais e policiamento focalizado nos pontos de maior incidência, complementados com aprimoramento de metodologias de investigação e de análise de provas periciais.

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O secretário nacional da Segurança Pública, Mário Luiz Sarrubbo - Karime Xavier - 20.mar.2020/ Folhapress - Folhapress

Outro grande desafio são a entrada e distribuição dos combustíveis que movimentam as principais máquinas do crime organizado: drogas, armas, munições e contrabando. A invasão de fronteiras com esses produtos, a logística de distribuição através dos estados e a lavagem de dinheiro resultante dos negócios do crime são responsabilidade exclusiva das políticas nacionais e agências federais. Entrando pelos estados e pelo Distrito Federal, esses produtos encontram estruturas criminosas —são 72 identificadas atualmente— que foram se instalando, pagando proteção a policiais corruptos, cuidando do varejo das vendas e defendendo ou atacando territórios concorrentes.

Nessa interface surgem as oportunidades para articulação do esforço federal com os estados, numa cooperativa de inteligência, definição de estratégias de contenção e combinação de forças de repressão às estruturas criminosas. Os Ministérios Públicos têm elevado potencial para fortalecer essas estratégias, articulando as ações policiais com o Judiciário —uma boa oportunidade para o promotor Sarrubbo levar sua experiência de gestão na área criminal em São Paulo, com marcantes resultados, como a execução de quase 500 operações que resultaram na recuperação de R$ 1 bilhão de ativos, 580 denúncias por lavagem de dinheiro e a condenação de 602 criminosos ligados ao PCC.

Mas não só letalidade e crime organizado tumultuam a vida dos cidadãos. E aí está o terceiro grande desafio da segurança: o varejo dos crimes cotidianos, que infernizam a sociedade. Dados da mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) revelam que, no período de um ano, 1,5 milhão de brasileiros foram vítimas de roubos e 2,9 milhões sofreram furtos variados, incluindo 334 mil veículos e quase 1 milhão de celulares.

São crimes que constrangem os cidadãos no dia a dia, não só como vítimas, mas também por induzir sensível sensação de insegurança que corrói a qualidade de vida. O novo ministro deve investir obsessivamente na redução da impunidade que estimula os violentos e os criminosos reincidentes que intranquilizam nossas ruas.

A Senasp, através de instrumentos indutores, como repasses financeiros, equipamentos, tecnologia, treinamento e suporte técnico, pode auxiliar no desempenho das polícias estaduais e na orientação de planos integrados das polícias com as administrações municipais para ampliar a efetividade do esforço preventivo.

Segurança pública se faz com gestão de evidências do que funciona, com informações robustas e confiáveis, competências aprimoradas para resultados e o máximo uso de recursos nos setores que possam influenciar resultados. Não é o caso de investir no falido programa Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania), no uso propagandístico da Força Nacional de Segurança Pública e em serviços de apelo midiático.

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