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Leitoras discutem encarceramento feminino a partir do livro 'Prisioneiras', de Drauzio Varella

Abandono feminino nas prisões é ponto central do debate; 'essencialismos de gênero' são apontados por leitoras

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São Paulo

Debater o encarceramento feminino no Brasil foi o objetivo do encontro entre as leitoras integrantes da comunidade Todas no WhatsApp nesta segunda-feira (5). A partir do livro "Prisioneiras" do médico e colunista da Folha Drauzio Varella as participantes comentam a repetição de alguns "essencialismos de gênero" presentes em sua escrita.

"Em alguns trechos ele insiste nessa coisa que as mulheres são maternais", diz Ana Trigo, 54. Em março, o assunto foi debatido pelo grupo a partir do livro "Manifesto Antimaternalista",da psicanalista e também colunista do jornal Vera Iaconelli.

Na ocasião, a leitora contou ao grupo que seu doutorado trata do desamparo ao qual estão submetidas mulheres dependentes químicas na cracolândia, tema central nos relatos trazidos por Drauzio. Ana, que é mestre e doutora em ciência da religião pela PUC-SP, diz que sua pesquisa mostra que as mulheres não necessariamente amam seus filhos de forma "automática" e ressalta que "Prisioneiras" reúne informações importantes. "Fica evidente que muitas acabam no crime por conta dos homens com quem se relacionam. Isso é muito cruel", diz.

O médico e colunista da Folha Drauzio Varella narra relatos do encarceramento feminino no livro "Prisioneiras", publicado em 2017 (Foto: Bruno Santos/Folhapress) - Bruno Santos/Folhapress

Somado a isso, Drauzio relata o abandono das mulheres encarceradas por parte de seus companheiros e familiares no capítulo "Solidão". "A sociedade é capaz de encarar com alguma complacência a prisão de um parente homem, mas a da mulher envergonha a família", escreve na página 38 da edição publicada pela Companhia das Letras.

Entre os casos narrados, chama a atenção das leitoras a história de uma mulher detida após a polícia encontrar drogas escondidas por seu irmão atrás de seu guarda-roupa. Mesmo ele assumindo a culpa, ambos foram presos e sua mãe viaja semanalmente por horas para visitá-lo. "Você tem juízo, ele precisa mais de mim", disse a mãe quando questionada pela filha em uma das raras vezes em que foi vê-la.

O abandono por parte dos parceiros também foi alvo de comentários: quando eles são presos, segundo relata Drauzio, elas são coagidas a manter visitas íntimas regulares; quando o mesmo acontece com elas, se veem sozinhas. Nesse sentido, o livro também explora as relações afetivas estabelecidas entre mulheres que se apoiam e dão carinho na situação de cárcere.

No capítulo "Sapatões", Drauzio narra o que ouviu sobre as categorias de relacionamentos amorosos das presas em suas décadas de trabalho nas penitenciárias de São Paulo. As mulheres que se relacionam com outras dentro da prisão são a maioria e se categorizam como "sapatões originais, folós, sacolas, chinelinhos, pães com ovos, badaroscas, entendidas passivas, ativas ou relativas e mulheríssimas". Para elas, suas relações estão isentas dos preconceitos. "Podem viver sua sexualidade da forma que lhes aprouver, sem enfrentar repressão social", escreve o autor.

As leitoras, no entanto, apontam a reprodução do machismo na categorização estabelecida pelas prisioneiras, já que as denominações hierarquizam as relações, prevalecendo sempre as vontades daquela que assume o papel tido como masculino com base em comportamentos e vestimentas esterotipadas, por exemplo.

Para Lina Freitas, 34, a prevalência do crack na trajetória das mulheres que são presas chama a atenção. Uma delas diz ao autor que a prisão salvou sua vida. "Essa leitura me fez pensar muito nas crianças que são fruto de gestações no crack e já nascem dependentes", diz a leitora.

O debate virtual foi o quarto de uma série de leituras coletivas proposta pelas participantes da comunidade. Os encontros acontecem mensalmente.


A comunidade Todas no WhatsApp é uma iniciativa da Folha para conectar leitoras, assinantes ou não, entre si e com a Redação. Para participar dos grupos de conversa preencha este formulário ou escreva para interacao@grupofolha.com.br informando nome completo, idade, cidade e assuntos de interesse.

Como parte da iniciativa Todas, a Folha presenteia mulheres com dois meses de assinatura digital grátis.

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