Siga a folha

Macron defende solução de Putin para estabelecer paz na Ucrânia

Apoio é para arranjo nas áreas rebeldes do leste, mas não para demandas gerais do russo

Assinantes podem enviar 5 artigos por dia com acesso livre

ASSINE ou FAÇA LOGIN

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

São Paulo

Um dia após passar mais de cinco horas à mesa com Vladimir Putin em Moscou, o presidente francês, Emmanuel Macron, defendeu em Kiev nesta terça (8) que a única saída para negociar uma paz no leste da Ucrânia é justamente aquela defendida há anos por seu colega russo.

"Os Acordos de Minsk são o único caminho que nos permitirá estabelecer a paz, o único caminho para encontrar uma solução política duradoura", afirmou Macron em entrevista coletiva com seu colega Volodimir Zelenski, na capital ucraniana.

Não se trata de uma capitulação aos termos mais gerais que Putin estabeleceu para a crise de segurança no Leste Europeu, rejeitados por EUA e pela Otan, aliança militar ocidental da qual Paris faz parte. Mas é um sinal de que a pressão militar exercida pelo russo nos últimos meses pode começar a dar frutos.

Macron (esq.) e Volodimir Zelenski durante encontro dos presidentes na sede do governo em Kiev - Serviço de Imprensa da Presidência da Ucrânia/Reuters

Zelenski, um presidente frágil por sua origem antipolítica como comediante e sem muito apoio popular, com efeito não passou recibo ao francês, a quem recebeu em uma mesa consideravelmente menor do que o opressor móvel que havia separado Putin de Macron na véspera. Mas disse que "estamos esperando por uma oportunidade de encontro do Quarteto da Normandia no nível de chefes de Estado".

Ou seja, pediu um encontro com Putin, Macron e o primeiro-ministro alemão, Olaf Scholz, os artífices desse formato de negociação que ocorre desde 2014, quando a primeira versão dos Acordos de Minsk foi elaborada.

Ela fracassou em encerrar a guerra civil no Donbass (leste ucraniano), contudo, levando a um segundo texto, que abaixou a fervura militar mas nunca foi estabelecido completamente por resistências de Kiev: o arranjo prevê que as áreas dominadas há oito anos por separatistas pró-Rússia fiquem com a Ucrânia, mas com um status autônomo.

Nos últimos anos, Putin insistiu na implementação dessa versão, que na prática vai alcançar seu objetivo estratégico de manter a Ucrânia impossibilitada de entrar na Otan —a aliança não aceita membros com disputas territoriais tão sérias, e Kiev já havia perdido a Crimeia para Putin no mesmo 2014, quando o russo reagiu à queda do governo pró-Kremlin no país.

Desde novembro, a Rússia concentra tropas e equipamentos perto das fronteiras ucranianas, levando ao temor ocidental de uma invasão que ela diz não querer fazer. Seja como for, a mobilização deixou claro à Otan que uma ação pode ocorrer, o que já é bastante como instrumento de pressão.

O Ocidente —EUA e Otan à frente— segue rejeitando as demandas de Putin, de impedir a expansão do clube militar e a inclusão da Ucrânia. São exigências feitas para não serem aceitas, abrindo a porta para outras concessões, e talvez Macron tenha dado a senha. Ou então os pessimistas estão certos e o russo pode ir às vias de fato.

Os sinais seguem abundantes. Também nesta terça, três navios de assalto anfíbio russos que estavam no Mediterrâneo começaram a atravessar o estreito de Bósforo, rumo ao mar Negro e às águas contestadas da Crimeia para um exercício naval. Outras três embarcações do mesmo tipo farão o mesmo na quarta.

Com isso, o temor ocidental de um cenário de guerra limitada no qual Putin não tente conquistar a Ucrânia toda, uma má ideia em vários aspectos, mas sim estabelecer um corredor por terra entre as áreas rebeldes e a Crimeia, passando pelos portos de Mariupol e Odessa, ganha tintas de verossimilhança com a presença de navios talhados para a missão na região.

Pode ser tudo blefe. Na Belarus, onde 30 mil soldados russos se exercitam com os aliados da ditadura local, há preocupação semelhante de ucranianos e da Otan. Nesta terça, contudo, o Ministério da Defesa da Rússia afirmou que todos irão voltar para seu país ao fim das manobras.

Com o movimento, Macron busca ocupar o vácuo europeu deixado pela saída de cena da ex-líder alemã Angela Merkel, e após a tentativa até aqui frustrada do atrapalhado premiê britânico, Boris Johnson, de exercer tal papel. Ele tem seus interesses: enfrenta eleição para tentar ficar no cargo em abril.

Diplomaticamente, Macron, contudo, corre o risco de ser visto como um elo de transmissão das vontades do Kremlin junto à Ucrânia. Mesmo uma fala de sua equipe em Kiev, de que Putin havia se comprometido a não mais fazer exercícios militares, teve de ser corrigida após negativa do Kremlin.

"Moscou e Paris não podem fazer acordos. A França é um membro da União Europeia e da Otan. Não está liderando a Otan", afirmou o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov. Macron, ao desembarcar em Kiev, foi obrigado a um malabarismo verbal, afirmando que "não haveria escalada" —nem o contrário, disseram os russos.

Depois de Kiev, o francês foi a Berlim, onde jantou com Scholz e o presidente polonês, Andrzej Duda. Os três falaram na saída do evento que ainda é possível "evitar a guerra na Europa". "Devemos entabular um diálogo exigente com a Rússia. A retomada desse diálogo é o único caminho para a paz", disse Macron.

Do outro lado do Atlântico, os Estados Unidos por ora mantêm a temperatura alta no campo do confronto, em contraste com a abordagem mais ambígua dos europeus.

Na segunda (7), o presidente Joe Biden havia dito ao lado de Scholz que o principal projeto energético russo na Europa, um gasoduto que liga o país de Putin à Alemanha, iria acabar em caso de guerra. Nesta quarta, ao comentar as falas de Macron, a Casa Branca disse apenas que Biden irá falar em breve com o colega francês.

No meio de tudo está Jens Stoltenberg, o norueguês que chefia a Otan. Em entrevista à rede CNN, ele mediu palavras, com um pé no pessimismo. "Não há certeza [acerca da invasão], mas o que vemos é uma contínua escalada militar, com mais e mais forças. O tempo dos alertas está acabando, e o do risco de um ataque, crescendo", disse.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas