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Descrição de chapéu memes

Com humor, New Memeseum rompe com 'romantização' na arte

Paródia de museu de Nova York questiona 'mercado de personalidades'

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São Paulo

A página de memes New Memeseum se define como um "museu de arte digital" em seu perfil do Instagram com 336 mil seguidores. A primeira publicação foi feita em 31 de julho de 2020 e apresenta a conta com uma série de logos: New ("Meme", "Brazilian", "Ideas", "Look at me" e "Open") Memeseum.

Já o primeiro meme publicado é um print do documentário "Espaço Além - Marina Abramović e o Brasil", de 2016, durante uma cena em que a artista fala: "Estamos aqui, basicamente, no meio do nada. É o Brasil."

A intenção do perfil, que é anônimo e não revela nem mesmo quantas pessoas trabalham na equipe, é criticar o mercado de arte contemporâneo. "O anonimato é um reflexo de nosso incômodo sobre como os autores, mais especificamente os artistas, têm se narrado nas redes sociais", escreve o New Memeseum por email ao #Hashtag.

O perfil surge a partir de discussões dos criadores que, em meio a pandemia, notaram uma hiperprodutividade do setor artístico. Para eles, houve uma aproximação da arte com a influência digital, o que resultou no acirramento de um "mercado de personalidades". "Parece inevitável não reproduzir um modo de narrar-se sem repetir a fórmula dos heróis que, enfrentando uma infinidade de percalços no seu caminho, vencem as adversidades."

No entanto, para o coletivo, a emergência sanitária apenas salientou algo que já era perceptível: "A arte é tão classista que, às vezes, ela acaba naturalizando e reproduzindo discursos 'romantizantes'."


O nome vem como uma paródia do New Museum de Nova York, do qual reproduzem, inclusive, o design gráfico. Fundado em 1977 pela curadora Marcia Tucker, o museu é considerado o primeiro a ter acervo dedicado à arte contemporânea em Nova York desde a Segunda Guerra Mundial.

"Olhando o sistema da arte a distância, tudo parece funcionar misteriosamente e, por isso, nosso maior desejo foi tentar se aproximar das suas engrenagens invisíveis, tentar entendê-las.", afirmam os criadores da página satírica.

No site do museu, a atuação do local é definida como "uma instituição não colecionadora, apresentando exposições de referência e colaborando com artistas para apoiar novas produções, experimentações e novas formas de fazer arte."

"Como os memes estão sempre associados ao novo, ao viral, ao que ainda não parece ter se institucionalizado, decidimos parodiar a missão deste museu", escreve o New Memeseum. "Até porque os memes parecem trazer mais ideias e reflexões, e conectam-se mais com os públicos do que os próprios museus na atualidade.", defendem.

6 silhuetas de pessoas em frente de fundo branco
Ilustração do coletivo anônimo da página de memes New Memeseum - Divulgação

Apesar de não darem detalhes pessoais, os criadores contam que muito do que é publicado tem alto teor autobiográfico, o que indica uma relação profissional não especificada com o mundo da arte.

"Os memes servem para rir de nós mesmos. São uma ferramenta de autocrítica", diz a página que, para embasar, cita um trecho do texto 'O Valor do Riso', de Virginia Woolf: "Mais do que qualquer outra coisa, o riso preserva nosso senso de proporção; lembra-nos sempre que somos apenas humanos, que não há homem que seja um herói completo ou inteiramente um vilão".

No começo, o feed do New Memeseum trazia situações do cotidiano de artistas, conflitos com curadores e estereótipos do ofício, que eram ilustrados por clássicos virais. Esse ainda é o principal tema do perfil atualmente, mas também são publicados memes mais gerais sobre a cultura brasileira.

"Começamos a ficar mais atentos aos tipos de conteúdo e aos mecanismos das redes sociais, justamente porque isso tudo tem se transformado, desde os modos de se produzir imagens por parte dos artistas até os modos de circulação e legitimação", afirma o New Memeseum.

A linguagem da página foi sendo definida aos poucos. Diariamente, os criadores reúnem vídeos e imagens que veem na internet, de outros criadores de conteúdos, e também recebem a colaboração dos seguidores. "Preferimos pensar o perfil como um experimento cotidiano, talvez mais compromissado com o presente e a intuição do que com a execução de uma cartilha de metas e obedecendo as métricas da plataforma."

Dentro dessa crítica aos moldes conservadores disfarçados de progressistas da arte, a página reforça a discussão sobre a função política do humor, que sempre foi considerado um gênero inferior.

"Manifestações culturais como os memes poderiam ser caracterizadas como formas de resistência a determinadas situações, pessoas e conjunturas, já que ‘resistência’ não pressupõe, necessariamente, confronto violento e direto, mas a capacidade de fazer frente às investidas do poder constituído, ainda que de maneira sutil."

Mesmo com críticas ácidas ao mercado, o New Memeseum já saiu em alguns veículos especializados em arte, participou como curador de uma exposição virtual sobre capinhas de botijões de gás e se tornou objeto de estudo para um trabalho de conclusão de curso de graduação de artes visuais.

"Acreditamos que não seja contraditório porque, se nós possuímos algum papel de crítica, ela é feita de dentro desse sistema. Estamos imersos nisso e não temos nenhum primado ético e moral que nos separe, ou nos torne superiores, daquilo que criticamos", afirma a página.

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