Queijo de ovelha ganha espaço e vira aposta dos produtores

Famosa na Europa, variedade agora conquista mercado nacional e vai participar do Mundial do Queijo do Brasil

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Rebanho da Atalaia, em Amparo (SP) Divulgação

São Paulo

"E queijo de ovelha existe? Desde quando ovelha dá leite?". Essas são algumas das perguntas que o produtor Paulo Rezende, proprietário da Fazenda Atalaia, escuta dos visitantes que ficam sabendo sobre seus novos produtos.

Fabricante de queijos de vaca e de cabra, entre eles o tulha, medalha de ouro no World Cheese Awards de San Sebastián, na Espanha, Paulo está lançando seus primeiros queijos de ovelha.

Os queijos de ovelha das variedades araritaguaba, maratimba, guaiana e ave cuia, todos feitos na Rima - Angelo Dal Bó

Cremosos, maturados por 21 dias, saem com casca lavada ou com mofo branco e devem chegar ao mercado dentro de 90 dias.

Quem visita a fazenda, localizada em Amparo (SP), já consegue degustar as novidades e ver os animais. "Muita gente nunca viu uma ovelha de perto, mas todos demonstram vontade de provar os queijos", diz o produtor.

Paulo Rezende não está sozinho. Queijeiros brasileiros, e paulistas em particular, estão finalmente apostando no potencial dos queijos de ovelha.

Trata-se de um mercado que ainda está engatinhando no país. De acordo com o Guia do Queijo, elaborado em 2021 pelo queijista Fernando Oliveira, os queijos de ovelha respondem por apenas 2% da produção nacional.

Mas eles têm tudo para ganhar expressão, como já acontece na Europa —são à base de leite de ovelha os famosos pecorino italiano, feta grego, manchego espanhol e Serra da Estrela português.

"O consumidor ainda tem resistência, o que atribuo à falta de opções. Temos poucos produtos para oferecer", avalia o queijista Falco Bonfadini, proprietário da loja Galeria do Queijo, na Vila da Saúde.

Entre as novidades que começam a chegar ao mercado estão os queijos da Herdade Duas Serras, lançados em março de 2022 pelo casal Henrique Sutto e Ana Claudia Paranhos.

Na propriedade, localizada em São Bento do Sapucaí (SP), eles montaram uma cabanha de primeiro mundo, que já conquistou o Selo de Inspeção Federal (SIF), fato raro entre pequenos produtores artesanais.

Os 180 animais são da raça leiteira lacaune, de origem francesa. Inspirados pelas famílias portuguesas, Henrique e Ana Claudia investem em queijos maturados entre seis meses e um ano, que repousam em uma cave de pedra subterrânea, com umidade e temperatura controladas.

No e-commerce próprio, que começa a funcionar em outubro, a peça com cerca de 500 gramas vai sair por R$ 110.

"As ovelhas se alimentam livremente das frutas do pomar, por isso algumas pessoas já sentiram notas frutadas nos queijos", diz Henrique, que promete entregas em todo o país.

Presidente da Associação Brasileira de Criadores de Ovinos Leiteiros (Abcol), Martha Amaral reivindica o posto de pioneira entre os produtores paulistas —foi em 2015 que ela lançou os queijos de ovelha Gran Sierra.

Dona de um sítio em Cunha (SP), Martha dispõe de apenas um ajudante para ordenar as ovelhas e transformar os 50 litros de leite diários em quatro tipos de queijos, além de doce de leite. O Cangalha matura por até 180 dias, mas há também a versão fresca, campeã de vendas.

"A divulgação é um trabalho de formiguinha, por isso participo de tantos eventos. A maioria do público não conhece e confunde com o queijo de cabra", diz Martha.

O próximo compromisso de sua agenda é o Mundial do Queijo do Brasil, que acontece esta semana em São Paulo. Além da competição que vai eleger os melhores queijos do país, entre 1.200 produtos inscritos, o evento terá uma feira aberta ao público, com entrada gratuita.

Outro produtor paulista que já garantiu presença é Ricardo Rettmann, de Porto Feliz (SP), que fundou a Queijaria Rima em 2017. Atualmente, ele é o maior do estado —seu rebanho de 800 animais rende uma produção diária de 200 litros de leite.

Da cave da Rima, saem queijos como o Araritaguaba, maturado por um ano —no e-commerce da marca, o pedaço com 200 gramas custa R$ 62,90. Mas há outros bem frescos.

Sua coalhada seca de ovelha, por exemplo, foi o produto escolhido para integrar dois pratos do Roteiro Gastronômico, que faz parte do Mundial do Queijo do Brasil: de 15 a 25 de setembro, 15 estabelecimentos da capital vão servir receitas exclusivas com queijos brasileiros.

No Shuk Falafel & Kebabs, a coalhada será servida com tomatinho confit, azeite Olibi e pão de zátar (R$ 32). Na Le Jazz Brasserie de Pinheiros, acompanha a kafta de cordeiro com pistache e cuscuz marroquino (R$ 45).

"Quando começamos, fazer queijo de ovelha era uma coisa de outro mundo. Felizmente a coisa evoluiu muito, não estamos mais sozinhos no barco", diz Ricardo.

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Queijo fresco de ovelha da Rima - Divulgação

Ele tem razão. O time só faz crescer e, em breve, será ainda maior —três novos produtores paulistas estão em fase de certificação sanitária e planejam colocar seus queijos de ovelha no mercado até o ano que vem.

Em Joaquim Egídio, distrito de Campinas (SP), o casal de engenheiros Genivaldo Pimenta e Daniele Santos ainda não vende seus queijos, mas acaba de abrir a Cabanha Capestre 53 à visitação.

Junto com as filhas Marina, que é bióloga, e Elena, que é química, eles recebem turistas interessados em conhecer o rebanho de 48 animais e fazer piqueniques com os produtos da casa, do suave Boursin aos longamente maturados.

"Com leite de ovelha, todo queijo que a gente planeja fazer fica maravilhoso", derrete-se Genivaldo, que já viveu na Espanha e, lá, aprendeu a apreciar a iguaria. "Temos dos leves e frescos, bons para o café da manhã e a sobremesa, aos mais intensos."

Também está em vias de certificação a Cabanha Bocaina, em Cunha, que pertence ao casal Virgílio Paiva e Fernando Marques. Na propriedade que adquiriram em 2018, eles mantêm 25 ovelhas e já fazem queijos e doce de leite para consumo próprio, enquanto o Selo de Inspeção Municipal não sai.

"O primeiro a ser lançado será o tipo feta", anuncia Virgílio, de olho nos consumidores do Vale do Paraíba e de Paraty.

O industrial Marcio Tosi, proprietário da Langhi & Tosi, em Cabreúva, considera sua produção de queijos de ovelha um hobby. "Na pandemia, preso no sítio, fiquei doido vendo o capim crescendo e inventei a queijaria", confessa.

Mas ele sabe que não vai resistir —tem pronto o plano para abrir a propriedade a visitantes e já deu entrada na papelada para obter a certificação estadual, para que mais gente conheça sua produção.

"Estou fazendo um tipo manchego, com três meses de maturação, um tipo pecorino, que ainda não está pronto, um de casca lavada com cerveja preta e um boursin", enumera.

Para o veterano Ricardo Rettman, a entrada de novos produtores no segmento é motivo de festa.

"Não considero os outros queijeiros como concorrentes. É muito legal que surjam outros produtores, para que o público tenha cada vez mais acesso ao queijo de ovelha."

Mundial do Queijo do Brasil

De 15 a 18 de setembro. Teatro B32 (Av. Brigadeiro Faria Lima, 3.732, Itaim Bibi, São Paulo). Informações em mundialdoqueijodobrasil.com

Onde comprar

A Queijaria

R. Aspicuelta, 35, Vila Madalena, loja online aqueijariavirtual.com.br.

Galeria do Queijo

Hortifruti Imigrantes (Av. Professor Abraão de Morais, 1.500, box 6, Vila da Saúde). Instagram @galeriadoqueijo.

Herdade Duas Serras

herdadeduasserras.com.br (vendas online a partir de outubro).

Queijaria Rima

queijariarima.com.br

Para visitar

Cabanha Campestre 53

@cabanhacampestre53. Agendamento pelo telefone (19) 99761-1706.

Fazenda Atalaia

fazendaatalaiaamparo.com.br. Agendamento pelo telefone (19) 99750-8129.

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