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Quanto
vale a fortuna de Silvio Santos?
Um dos
boatos mais recorrentes do país voltou a circular na
semana passada. Movido por uma crise existencial e disposto
e aproveitar mais a vida, Silvio Santos estaria disposto a
entregar 30% do SBT, mais um salário de R$ 2 milhões
mensais, para José Bonifácio de Oliveira Sobrinho,
o Boni, tornando-o seu sucessor.
Como de
costume, os boatos foram negados por ambos os lados. É
certo, porém, que existem indícios de que o
empresário, aos seus 71 anos de idade, esteja metido
em dúvidas existenciais.
Ele já
fez chegar a alguns de seus mais próximos executivos
a idéia de que, como em todos esses anos ganhou muito
dinheiro, agora estaria na hora de devolver parte de sua fortuna
aos mais pobres - afinal, graças a eles, encheu o baú,
vendendo a ilusão de riqueza fácil. Ainda não
sabe como (e se) vai devolvê-la.
Talvez
crie uma fundação educacional, hábito
corriqueiro entre empresários americanos que procuram
deixar o nome na posteridade.
Compreensível:
materialmente não lhe falta nada. Ele retira de suas
empresas anualmente o valor líquido (descontados os
impostos) de R$ 40 milhões. Não é fácil
gastar R$ 3,3 milhões mensais. Seu patrimônio
já passou, há muito tempo, de R$ 1 bilhão.
Antes
mesmo do sequestro, Silvio Santos inquietava-se com as dúvidas
sobre seu papel na sociedade. Por isso nutriu ambições
políticas, todas fracassadas. Viu sua família
apegar-se fervorosamente à religião evangélica,
o casamento entrou em colapso e, neste ano, depois de virar
refém do sequestrador de sua filha, sentiu, como nunca,
a fragilidade humana. Percebeu que toda a sua fortuna não
consegue comprar o simples direito de estar em casa ou de
andar na rua sem medo.
É
natural que qualquer indivíduo submetido a tantos sinais
de vulnerabilidade questione a importância, de fato,
do sucesso e do dinheiro - ainda mais quando vai ficando mais
próximo dos limites biológicos, o que estimula
a reflexão sobre como será lembrado. Ou se será
lembrado. Muita gente pode fazer sucesso de curta duração:
na semana passada, por exemplo, não se falou em outra
coisa que não fosse a volta de Alexandre Frota à
"Casa dos Artistas", cuja importância para
a posteridade no cenário cultural brasileiro se resumia,
até agora, na difusão do funk carioca.
Essa é
a base psicológica na qual brotam os prosaicos boatos
sobre uma eventual mudança de comando no SBT. Não
é um caso isolado: nos subterrâneos dos núcleos
de poder empresarial, é crescente o número de
executivos e mesmo de empresários que, após
terem obtido fama e dinheiro, revelaram publicamente que passavam
por crises existenciais.
É
uma "confissão" que, até há
pouco tempo, seria vista como sinal de fraqueza e de incapacidade
de liderança.
Empresa
de recursos humanos, a Manager realizou um levantamento com
executivos de São Paulo, do Rio de Janeiro, de Campinas
e de Belo Horizonte. A imensa maioria deles queixou-se de
não ter tempo para cuidar da saúde física
e psicológica. Vivem alarmados com o temor de sofrer
um infarto ou um derrame, mas, mesmo assim, não consultam
frequentemente os médicos.
Para 76,5%
dos 470 entrevistados, muitos deles de empresas que fazem
a diferença no PIB brasileiro, estar com a família
nos momentos de lazer é o melhor sinônimo de
qualidade de vida. "Eles passam a viver divididos",
diz Sylmara Valenti, coordenadora da Manager.
A decisão
de mudar de atitude surge quando o indivíduo sofre
algum baque - perde o emprego, é abandonado pela mulher,
vê o filho às voltas com drogas. "É
nessa hora que ele pensa que se expôs demais e que,
consequentemente, perdeu coisas importantes, como a saúde,
os momentos de lazer com os amigos e a possibilidade de acompanhar
o crescimento dos filhos", analisa Sylmara.
Para estudar
esse tipo de comportamento, a Unicamp criou na Faculdade de
Educação Física o Departamento de Estudos
de Lazer. Ali os pesquisadores estão convencidos de
que existe uma "síndrome do lazer", associada
a dores musculares, gripes, enxaquecas e mal-estar físico.
Tais sintomas,
entre outros, manifestam-se quando o indivíduo está
perto do final da semana e, em especial, das férias.
É gente que se sente sem ar quando está fora
do trabalho. "Feriado para essas pessoas é pânico.
São pessoas que não conseguem relaxar sem culpa",
afirma Antônio Carlos Bramante, do Departamento de Estudos
de Lazer.
O executivo,
segundo ele, sente-se lisonjeado porque ganha da empresa um
notebook para trabalhar em casa. "Não consegue
perceber que a empresa está consumindo as poucas horas
que ele teria para lazer."
Boa parte
da culpa da supervalorização do desempenho profissional
pode ser atribuída aos educadores e às escolas,
que, reforçando a noção de que o sucesso
é medido só pelo que fazemos ou temos, não
ensinam o valor óbvio de que mais importante do que
ter é ser. Dada a insistência da pergunta, as
crianças aprendem desde cedo a responder aos adultos
o que querem "ser" quando crescerem. É das
perguntas mais cretinas que conheço; pressupõe
que, enquanto não tem trabalho, você não
é nada.
PS - Por
causa da imagem ruim (em boa medida justificada) de Silvio
Santos entre formadores de opinião, São Paulo
corre o risco de perder um bom investimento urbano. O empresário
quer gastar R$ 75 milhões para criar um sofisticado
centro cultural no deteriorado bairro do Bexiga, onde fez
sua carreira. O espaço englobaria o Teatro Oficina,
hoje administrado pelo dramaturgo José Celso Martinez.
Por conta disso, um movimento de artistas, apoiados por promotores,
está impedindo a realização da obra.
Uma cidade tão carente de recursos e de empregos não
tem o direito de desprezar esse tipo de melhoria.
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