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Televisão pantanal

De 'Pantanal' a 'Senhor dos Anéis', tamanho foi documento na TV e no streaming em 2022

Ano foi marcado por séries com orçamentos dignos de blockbusters de Hollywood e reorganização do mercado

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Alanis Guillen como Juma, de "Pantanal" João Miguel Júnior/Globo

São Paulo

Tamanho nem sempre é documento, mas na televisão e no streaming, em 2022, com certeza foi. Olhar para a área nos últimos 12 meses causa até vertigem no espectador, que pode nem se lembrar de sucessos mais longínquos depois de um ano marcado por um volume imenso de lançamentos.

Sadie Sink em cena da nova temporada de "Stranger Things", que causou burburinho quando estreou - Divulgação

Teve série para todos os gostos, e nem o Emmy soube quem ignorar e quem indicar na primeira edição do prêmio em que todas as grandes plataformas de sob demanda tinham produções elegíveis para apresentar aos votantes.

Mas não foi só em termos de catálogo que a discussão sobre tamanho se fez presente. Netflix, HBO Max, Amazon Prime Video e Disney+ encerram o ano mais uma vez sem divulgar dados de audiência, mas todas com produções superdimensionadas, com orçamentos e marketing dignos dos maiores blockbusters de Hollywood debaixo do braço.

Neste "o meu é maior que o seu", a Netflix fez estardalhaço ao relançar "Stranger Things" e depositou várias fichas em "Sandman". A HBO Max tentou reviver o frenesi em torno de "Game of Thrones" com "A Casa do Dragão". O Amazon Prime Video encheu os olhos com os belos e caros cenários de "O Senhor dos Anéis: Os Anéis do Poder". E o Disney+ enfileirou um novo título de Marvel e "Star Wars" atrás do outro.

Para efeito de comparação, cada episódio da quarta temporada de "Stranger Things" foi orçado em US$ 30 milhões. Ao todo, portanto, foram US$ 270 milhões para a nova leva –cerca de US$ 100 milhões a mais que o orçamento do filme "Top Gun: Maverick", maior bilheteria de 2022.

A cifra ultrapassa os US$ 200 milhões de "A Casa do Dragão", mas não chega perto dos US$ 715 milhões, ou R$ 3,8 bilhões, investidos na temporada inicial de "Os Anéis do Poder", que se firmou como a série mais cara da história.

Foi um ano de fartura para os nerds, mas nem por isso títulos mais tradicionais e comedidos, digamos, deixaram de pautar discussões televisivas. "Ruptura", "Inventando Anna", "Euphoria", "The White Lotus", "Only Murders in the Building" e "Wandinha" retornaram ou estrearam com alvoroço nas redes sociais, causando em muita gente a tal síndrome do FOMO –o medo de ficar por fora das tendências do momento.

Essa avalanche de conteúdo que os gringos despejaram no streaming, no entanto, não enfraqueceu a indústria nacional. Em meio à novela criada pela gestão Bolsonaro em torno da Ancine e dos mecanismos de fomento ao audiovisual, o setor encontrou dinheiro nessas mesmas plataformas, que investiram em títulos como "O Rei da TV" e "Manhãs de Setembro" –e, ao mesmo, acirraram disputas sobre a urgência de regulamentar esse mercado.

Para as empresas brasileiras e a TV aberta, fica difícil competir com os cofres da Amazon ou da Apple, mas a Globo, em especial, deu continuidade, em 2022, a reestruturações e investimentos que tentam prepará-la para os novos tempos de tela. E se ela não tem o mesmo poderio financeiro das rivais, ao menos sai na frente por conhecer o mercado brasileiro como ninguém.

Quem diria que em pleno 2022, afinal, um dos títulos mais comentados do ano seria uma novela?

"Pantanal" foi capaz de unir gerações em torno do horário nobre, que parecia fadado a um gradual apagar das luzes, num golpe de mestre que embalou um sucesso estrondoso do passado em discussões politizadas, ares moderninhos, personagens carismáticos e muitas cenas quentes. Jove e Juma não tiveram dificuldade de fazer do seu romance o mais comentado das telinhas.

Manter a audiência interessada foi uma missão confiada à experiência de Gloria Perez, que emplacou sua "Travessia" no horário nobre rodeada de polêmicas. Isso porque a autora escalou para um dos papéis principais a influenciadora Jade Picon, que nunca tinha atuado, na tentativa de fisgar os jovens.

Incapaz de conquistar a simpatia do público e alvo de chacota, ela se juntou ainda a controvérsias nos bastidores, com Cássia Kis virando uma pedra no sapato da Globo após tecer declarações homofóbicas e rezar em manifestações golpistas depois da derrota de Bolsonaro nas eleições.

Nem Perez escapou de polêmica. Apesar de "Travessia" tentar problematizar o perigo das fake news, que arruinam a vida da protagonista do folhetim, a dramaturga curtiu um tuíte favorável ao presidente derrotado, conhecido justamente por compartilhar notícias falsas. Pareceu contraditório para muita gente.

Enquanto o folhetim naufraga na TV aberta, outra novela da Globo com jeitão de trama das nove floresce no streaming. "Todas as Flores", escrita por João Emanuel Carneiro, estreou direto no Globoplay, quase ao mesmo tempo, e não demorou para conquistar público e crítica.

Também dá sinais de desgaste o Big Brother Brasil, que depois de misturar famosos e anônimos em duas edições grandiosas decepcionou ao apresentar um elenco insosso. O vencedor Arthur Aguiar, que entrou cancelado, logo sumiu dos holofotes. Nem a Globo quis saber dele, escancarando a falta de prestígio desta edição.

Faustão é outro que foi tratado com desdém pela emissora no ano passado, quando perdeu seu programa. O apresentador estreou no começo deste ano na Band, mas com poucas novidades e num formato exaustivo, que fez a audiência despencar ao longo dos últimos meses. A atração é outra que parece presa demais aos moldes do passado, sem possibilidade de rivalizar com os burburinhos que o streaming causa sem muito esforço.

Uma das maiores plataforma do ano juntou, curiosamente, o universo da TV aberta com o do sob demanda. Graças à HBO Max, a história do assassinato de Daniella Perez, mocinha das telas nos anos 1990 e filha de Gloria Perez, voltou a ganhar manchetes, com o documentário "Pacto Brutal". Num "plot twist" digno das boas teledramaturgias, o homicida Guilherme de Pádua, que passou o ano sob os holofotes, morreu precocemente no mês passado, após um infarto.

Batizado de "true crime", o gênero que se apropria de crimes famosos para transformá-los em filmes ou séries esteve em alta em 2022. Além de "Pacto Brutal", documentários sobre a ex-deputada Flordelis, condenada por matar o marido, também estreiam no streaming neste fim de ano. O caso da Escola Base é outro que foi revisitado no Brasil, enquanto lá fora "Dahmer: Um Canibal Americano" dividiu opiniões com seu retrato cruel dos assassinatos de Jeffrey Dahmer.

Não foram só os homicidas que entraram nessa tendência de adaptações baseadas em fatos reais. Golpistas e arquitetos de grandes fraudes também geraram interesse como nunca antes, captando os olhares das plataformas de streaming que se digladiam para conquistar assinantes.

Nessa guerra, vários serviços começaram a testar formatos para se aproximarem do público. Disney+ e Netflix, por exemplo, lançaram versões mais baratas, parcialmente custeadas por anúncios. Combos de assinatura também se tornaram realidade e a sensação é a de que o streaming foi buscar na televisão tradicional estratégias para crescer, numa estranha ironia.

Nos bastidores, a HBO Max foi provavelmente quem mais enfrentou obstáculos. Para além dos desafios comuns ao mercado, a plataforma se vê no meio de um enrosco patrocinado pela fusão da WarnerMedia e da Discovery, Inc., que alçou David Zaslav ao posto de CEO da nova Warner Bros. Discovery e alterou os rumos da empresa.

Títulos saíram da HBO Max na surdina, lançamentos foram cancelados –o mais notável deles, "Batgirl", já estava até pronto– e vários funcionários foram demitidos. O futuro para o que é hoje a plataforma de sob demanda mais bem avaliada dos Estados Unidos é indecifrável.

Ainda em tom amargo, 2022 foi ano de despedida para um dos gigantes da televisão brasileira, Jô Soares. O apresentador e humorista, dono de icônicos bordões e personagens, morreu aos 84 anos, em agosto. A ele se juntaram Claudia Jimenez, Milton Gonçalves, Rolando Boldrin, Françoise Forton e Marilu Bueno. Lá fora, Angela Lansbury, Anne Heche, Tony Sirico e Leslie Jordan.

Outro nome indissociável da televisão brasileira que se despediu, mas por aposentadoria, foi Galvão Bueno, que decidiu que a Copa do Mundo vencida há dias pela Argentina seria sua última aventura como narrador esportivo da Globo.

Após a transmissão da última partida do torneio, ele revisitou os vários auges da carreira de meio século, da conquista do pentacampeonato às vitórias de Ayrton Senna, se emocionou e deu um recado politizado, em que reivindicou a camisa da seleção para todos os brasileiros.

Bem, amigos, foi um ano de fortes emoções.

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