Conheça a trajetória de Leandra Leal, de atriz mirim a diretora e criadora de série

Artista começou em 'Pantanal', foi premiada por 'Divinas Divas' e agora está no comando de 'A Vida pela Frente', no Globoplay

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Retrato da atriz Leandra Leal, em seu apartamento no Rio de Janeiro Eduardo Anizelli/Folhapress

São Paulo

Vida e obra se confundem ao longo da carreira de Leandra Leal. Não que ela escolha seus papéis com base em suas crenças políticas e visões de mundo, mas parece natural que trabalhos que dialoguem com seu lado mais pessoal a encontrem.

Foi assim com o recente "Aruanas", série sobre ativistas ambientais que tem respaldo em sua presença no conselho do Greenpeace, e também em "Zuzu Angel", filme de 2006 que denunciou os males de uma ditadura contra a qual ela, que se considera uma ativista indignada, já vociferou.

Essa simbiose, porém, se torna verdadeiramente deliberada no novo projeto da atriz, que faz muito mais do que atuar na série "A Vida pela Frente", que chegou ao Globoplay na última quinta-feira (22).

A trama que aborda drogas e saúde mental entre jovens nos anos 1990 tem raízes em sua própria adolescência, e é Leandra quem assina a criação, junto com as amigas de infância Rita Toledo e Carol Benjamin, e a direção, ao lado de Bruno Safadi. É a sua estreia nas duas funções –ela até dirigiu o premiado documentário "Divinas Divas", sobre a revolução na noite impulsionada por artistas como Rogéria, mas ainda não havia se arriscado no terreno da ficção.

"Eu sempre fui muito devota do fazer cinematográfico, então estar nesse lugar sempre foi algo que eu quis. O que não anula meu papel como atriz, de forma alguma. Na verdade, eu acho que me tornei uma atriz melhor por isso", conta ela, que se diz mais empolgada que o de costume para falar da série.

Atriz também por influência do ambiente no qual cresceu –o avô comprou o tradicional teatro Rival, no centro do Rio de Janeiro, nos anos 1970 e a mãe é Ângela Leal, de folhetins como "Selva de Pedra"–, Leandra extrapola o destino que lhe parecia reservado quando fez sua estreia diante das câmeras com a primeira versão de "Pantanal", aos oito anos.

Hoje abusando de versatilidade, ela se desdobra em funções que vão além da memorização das falas, algo que ela credita justamente à infância e adolescência atravessadas não só por seus pares, mas também por técnicos de som, operadores de câmera e muitas outras equipes de bastidores que aguçaram sua curiosidade logo cedo.

Enquanto aprendia cada detalhe do ofício, ia colecionando papéis, como num ensaio para o acúmulo de funções que viria 32 anos mais tarde. Depois de "Pantanal", ela logo estreou nos filmes, em "A Ostra e o Vento", de Walter Lima Jr., levado a Veneza e que lhe rendeu os primeiros prêmios.

Cinema, televisão e teatro, assim, foram alternando ao longo da trajetória de uma artista que diz não priorizar um ou outro. Foi na telinha, no entanto, que a mini Leandra acumulou projeção, com papéis em "Explode Coração", "A Indomada", "Brava Gente" e "O Cravo e a Rosa", até atingir a maioridade.

Crescer diante das câmeras e nos palcos foi um processo quase normal, ela conta. Diferentemente de outros atores mirins, ela não tinha uma mãe que a esgotava –muito pelo contrário. E tampouco deixou de manter vários aspectos de sua vida reservados, algo que ela admite que seria mais difícil hoje, com as redes sociais.

"Eu sou muito grata por ter começado a trabalhar jovem. Era uma coisa que eu queria muito. Minha mãe, inclusive, não me incentivava tanto, ela queria que eu tivesse uma formação normal. Mas eu também vivi minha adolescência. Curti festa, show, viagem. Teve um Réveillon que eu estava com as amigas em Caraívas, chegou dia 3, de manhã, eu entrei num carro e fui para o Projac. E estava tudo bem."

Estavam lançadas as bases para uma atriz que, na vida adulta, não apagou, como acontece com tantas estrelas juvenis. A fama foi impulsionada pela enteada da temida Nazaré em "Senhora do Destino", com seus olhares expressivos delineados pela sombra escura e o piercing rebelde agarrado à sobrancelha.

A trama lhe abriu portas para "Páginas da Vida", "Ciranda de Pedra", "Passione", "Cheias de Charme" e "Império", numa frutífera trajetória dentro da Globo. No teatro, Leandra foi dirigida por Gabriel Villela numa montagem de "Vestido de Noiva" e por Bia Lessa na premiada "Pi – Panorâmica Insana".

Já na tela grande, esteve em "O Homem que Copiava", "Cazuza: O Tempo Não Para", "Chatô: O Rei do Brasil", "Bingo: O Rei das Manhãs" e o que é provavelmente seu trabalho mais elogiado, "O Lobo Atrás da Porta", que lhe rendeu láureas do Sesc, do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro e do Festival do Rio. "Nome Próprio" e "Éden", por sua vez, lhe deram dois Kikitos no Festival de Gramado.

Hoje mãe de Julia Leal Youssef, Leandra diz ainda estar cedo para saber se a pequena formará a terceira geração de atrizes da família. Mas nem precisa. Para ela, é como se a menina de oito anos –mesma idade com a qual começou– a acompanhasse a cada canto da carreira, graças à experiência transformadora de se tornar mãe.

É em tom maternal, também, que Leandra fala sobre os elencos jovens com os quais contracena, em especial o de "A Vida pela Frente". "De repente, assim do nada, eu falei ‘caraca, bicho, como o mundo gira, né? Eu agora ocupo outro lugar, proporcionando para essa galera jovem a mesma experiência que já proporcionaram para mim’. É bem emocionante."

Aos 40 anos, a atriz vem encavalando uma sequência feroz de trabalhos. Pela frente, ela tem a estreia na direção de um longa de ficção, sobre o qual ainda não pode dar detalhes. Enquanto o prepara, ela volta para as funções de atriz, em "Justiça", em que retoma a prostituta Kellen numa segunda temporada, com estreia no segundo semestre, e, também na Globo, já tem pronta a série "Betinho", em que faz a primeira mulher do sociólogo e ativista de direitos humanos homônimo.

No cinema, espera rodar festivais com "Nada a Fazer", que gravou ao lado da mãe durante a pandemia, e tem ainda "Os Enforcados", que retoma sua parceria com Fernando Coimbra, de "O Lobo Atrás da Porta". Tudo em paralelo à Daza Filmes, produtora que fundou, e com a administração do Rival, herdado por ela e por Ângela. Hoje, elas buscam patrocínio para a casa, abatida pela Covid-19.

"Minha mãe fala muito isso, que teatro não é herança, é missão. É assim que encaramos esse espaço, do qual nós cuidamos para a cidade do Rio de Janeiro, para a cultura brasileira como um todo. Vou te falar que está difícil, mas estamos lutando", diz sobre o teatro de iniciativa privada mais antigo da cidade.

Como essa missão atesta, fazer cultura no Brasil é trabalho árduo. É possível ter otimismo com o cenário menos hostil de agora, com a troca de governo recente, ela diz, mas é preciso ter pés no chão.

"O desmonte foi muito sério, bem como a criminalização pública que nós, artistas, vivemos. Não é de um dia para o outro que as coisas vão mudar. 'O Lula ganhou e acabaram os problemas'. Não, não é assim. Tem muito trabalho a ser feito, mas ao menos agora há uma preocupação com a cultura enquanto segmento econômico, enquanto ferramenta de educação, enquanto símbolo da subjetividade de todo um povo."

Outra luta tem sido levar "Cheias de Charme", novela exibida pela Globo em 2012, ao cinema, num projeto que se arrasta há anos. Redescobertas em forma de meme, as Empreguetes, banda formada por um trio de domésticas, devem entrar, elas próprias, como produtoras da adaptação.

Leandra Leal, Taís Araujo e Isabelle Drummond, ao lado da vilã Cláudia Abreu, vêm fazendo reuniões para reviver o projeto, que está em fase de desenvolvimento e em busca de um argumento, bem como de financiamento.

"A gente está estruturando tudo para fazer o filme, desenvolvendo e tentando vender. A gente quer que isso aconteça, quer reencontrar essas personagens. É uma novela que, dez anos depois, ainda é muito falada. Lá vou eu voltar a fazer aula de canto", se diverte, já prevendo mais uma faceta que vai ter que explorar em breve.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.