Argentina vive crise cambial, e dólar ultrapassa 1.000 pesos às vésperas de eleição

Disparada da moeda gera troca de acusações entre ministro Sergio Massa e Javier Milei, que propõe dolarização

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Buenos Aires

O argentino já esperava que o dólar paralelo, que puxa os preços no país, pudesse atingir os 1.000 pesos antes do fim do ano. Mas aconteceu mais rápido do que o previsto. A marca foi batida nesta terça (10), menos de duas semanas antes das eleições presidenciais, que agora ganham mais tensão com uma nova crise cambial e trocas de acusações sobre de quem é a culpa.

"São um bando de irresponsáveis", disse o ministro da Economia e candidato pelo peronismo, Sergio Massa, nesta segunda (9), quando a moeda já estava em ascensão. Ele acusa seu maior rival, o ultraliberal Javier Milei, de estar gerando uma corrida ao dólar ao prometer dolarizar o país e eliminar o Banco Central caso seja eleito.

Apoiadores do candidato ultraliberal Javier Milei seguram dólares com sua imagem em evento de campanha em Buenos Aires - Cristina Sille-25.set.2023/Reuters

Mais cedo, Milei havia voltado a recomendar numa entrevista que os argentinos não usassem o peso para economizar ou investir: "Jamais em pesos, o peso é a moeda emitida pelo político argentino, portanto não vale nem excremento, esses lixos não servem nem como adubo", repetiu o deputado e economista.

Ele, por outro lado, tem postado repetidamente que a responsabilidade é dos últimos governos, principalmente kirchneristas. "É vergonhoso o espetáculo que os políticos estão dando, tentando obter vantagens políticas do desastre econômico, inventando responsabilidades. Se querem encontrar os responsáveis, olhem-se no espelho, sem-vergonhas", escreveu.

Já a terceira colocada nas pesquisas, a macrista Patricia Bullrich, convocou uma entrevista coletiva de urgência para falar da crise, na qual criticou os dois adversários.

"Entre o incendiário Massa, que nos está levando à hiperinflação, e a irresponsabilidade de Milei, que fomenta a fuga de capitais, estão os argentinos angustiados com o presente e o futuro", escreveu horas antes.

O chamado dólar "blue" subiu cerca de 30% em apenas uma semana, o que significa que todos os preços devem aumentar na mesma proporção. Se um argentino fosse a uma casa de câmbio paralela no último dia 3 —o que é proibido, mas comum, já que há muitas restrições para comprar a moeda oficialmente—, pagaria cerca de 810 pesos por dólar. Nesta terça, já estaria pagando 1.010.

Enquanto isso, o ministro e candidato Massa continua segurando o valor da moeda estrangeira usado em transações oficiais para tentar conter a inflação e, desde a semana passada, reforça o controle sobre a compra de divisas no mercado financeiro, à medida que investidores e poupadores se desfazem de seus ativos em pesos devido à constante desvalorização e alta inflação.

Nesta terça, a fim de evitar a saída de divisas, o governo aumentou os impostos para acessar o dólar usando cartões de débito ou crédito e unificou o valor de algumas cotações a 731 pesos, portanto ainda muito abaixo da paralela. Foi determinado que esse imposto será aplicado a qualquer valor de consumo, retirando o limite de US$ 300 por mês e por pessoa.

Grande parte dos economistas e bancos também apontam as promessas de dolarização de Milei como o principal motivo para a explosão do câmbio, mas também citam flexibilizações do governo e possíveis ações especulativas do mercado.

"Hoje, sem ser a moeda oficial, o dólar já tem uma demanda enorme e uma oferta muito contraída na Argentina. Se passar a ser a moeda legal, seu valor vai disparar ainda mais, portanto te convém comprar dólares hoje, o que faz o preço subir", explicou o economista argentino Ignacio Galará, do Centro de Estudos Monetários e Financeiros de Madri.

A crítica central dos especialistas à proposta de Milei é que o país tem reservas baixíssimas —até negativas, segundo estimativas– de dólares nos cofres do governo. Também dizem que, quanto mais alto o valor da moeda estrangeira, mais pobres os argentinos ficarão no momento em que seus salários forem transformados em dólar.

Milei já chegou a afirmar o contrário: que quanto mais valioso estiver o dólar e mais desvalorizado estiver o peso, mais barata fica a dolarização, já que se necessitaria menos moeda estrangeira "para trocar o Monte Evereste de pesos que há no país por um montinho de dólares", como cita o jornal Clarín.

Calcule o que falta para sua independência financeira

As perspectivas são de piora nos próximos dias e para depois do primeiro turno, em 22 de outubro. Foi o que ocorreu em agosto, depois do triunfo inesperado de Milei e de uma desvalorização parcial do peso promovida por Massa, atendendo a uma exigência do FMI para liberar empréstimos. Parte das vendas de produtos e serviços chegaram a ser paralisadas, já que não havia referência para os preços.

Finalizado o mês, contou-se uma alta de 12,4% na inflação —somando 124% em um ano—, o que é considerado altíssimo até para os padrões argentinos. As expectativas são de que o número de setembro, que será divulgado na quinta (12), também não fique muito atrás, gerando mais notícias negativas para o ministro da Economia.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.