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Paula Sion e Dora Cavalcanti

Cordeiro de Deus, tirai o ódio do nosso Brasil

Que as palavras do papa Francisco livrem os brasileiros da intolerância

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Paula Sion e Dora Cavalcanti

Advogadas criminalistas

Na última semana, a ilustre ministra Cármen Lúcia foi vítima de delito contra a honra praticado pelo sr. Roberto Jefferson em um vídeo grotesco, que ainda circula livremente na internet. O motivo? Uma decisão judicial por ela proferida que não lhe agradou. Simples assim.

Ministra, vossa excelência não está sozinha. Vítimas, promotoras de Justiça, advogadas e jornalistas estão sendo alvo de ataques gratuitos também. É preciso estancar a naturalização desses comportamentos insidiosos mal disfarçados de discursos de opinião.

Ampla defesa, contraditório e devido processo legal são valores fundamentais que norteiam o postulado da presunção de inocência. Claramente —ainda que analisados sob uma pitada da decantada liberdade de manifestação— não significam de maneira alguma carta branca para que ofensores e ofensoras se vejam no direito de destilar desprezo por meninas e mulheres.

Afinal, é possível invocar o direito legítimo a chamar uma mulher de vagabunda? É admissível, no melhor estilo Daniel Silveira, fazer uso da palavra para alardear nas redes impropérios violentos?

De que adianta o arsenal de leis coibindo as diversas forma de violência contra as mulheres editadas na última década, como a lei Carolina Dieckmann, a lei do Minuto Seguinte, a lei do feminicídio e a lei do "stalking", quando se tem no topo da República alguém que diz com tranquilidade ter "pintado um clima" com meninas de 14 anos, a quem atribuiu, em seu imaginário machista e sem qualquer embasamento, a pecha de garotas de programa?

É evidente que a cultura da violência contra a mulher, em suas variadas formas, ganhou força no seio do bolsonarismo, sendo as plataformas digitais um terreno fértil e propício para a propagação não só de ofensas misóginas, mas também para o crescimento da incontrolável indústria das fake news, que vem se alastrando como rastilho de pólvora. Estamos vivendo um delírio coletivo no qual a verdade não mais importa.

O ex-deputado Roberto Jefferson estava em prisão domiciliar e tinha como condição imposta pelo Judiciário a proibição de fazer postagens de cunho político nas redes. Logo, sua prisão no último domingo 923) —diferentemente do alardeado por aí— não foi motivada pelo crime de menor potencial ofensivo praticado contra a ministra do Supremo, mas sim pelo claro descumprimento de um regramento inerente à medida cautelar a que estava submetido.

Ao tentar efetuar a prisão de Jefferson, a Polícia Federal foi vítima de violência por parte dele, que do interior de sua nobre residência e em plena luz do dia não pensou duas vezes antes de efetuar disparos de fuzil e —pasmem— arremessar granadas contra os cumpridores da ordem judicial, acabando por ferir dois policiais. Tudo isso enquanto no terreno em frente estava em curso uma festa de aniversário infantil.

O presidente da República, em mais uma clara demonstração de interferência e desrespeito à autonomia das instituições, determinou o inusitado deslocamento do ministro da Justiça ao local dos fatos, o que não encontra guarida na Constituição Federal. Mas o "candidato padre" foi bem mais ligeiro! Chegou antes e logrou êxito em negociar a entrega das armas e a rendição do agressor, que está preso. Por mais que se queira negar, Jair Bolsonaro, "Padre" Kelmon e Roberto Jefferson são farinha do mesmo saco. Só não vê quem não quer.

Agora falando em padre de verdade, esperança e fé... A quatro dias do segundo turno, o papa Francisco, com a sabedoria que a todos encanta, rogou do Vaticano à Nossa Senhora Aparecida que livre o brasileiro do ódio e da intolerância. Um alento.

Querido papa Francisco, esperamos sinceramente que Nossa Senhora ouça as suas preces e que neste domingo (30) o povo brasileiro seja sábio o suficiente para dizer não à barbárie, não ao armamento da população civil, não ao desrespeito às nossas instituições, não ao autoritarismo e não à misoginia. O amor precisa vencer o ódio.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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