Nas últimas semanas, assistimos a casos de violência extrema dentro de escolas. Em São Paulo, um aluno de 13 anos matou uma professora e feriu outras cinco pessoas, enquanto em Blumenau (SC) um homem de 25 anos invadiu uma creche, matou quatro crianças e feriu outras quatro. Ouvimos após os eventos o receituário comum apresentado para lidar com problemas de violência no Brasil: colocar policiais, desta vez nas escolas, para controlar os efeitos do comportamento violento e impedir a aproximação de potenciais criminosos. Essa é a lógica intrínseca ao nosso modelo de segurança pública: não se busca afetar as causas estruturais do problema, mas estar pronto para reagir rápido quando ele é iminente.
O que pode ser feito para efetivamente reduzir a violência nas escolas? A primeira coisa é entender a estrutura do problema. Enquanto Blumenau lembra os ataques em massa às escolas norte-americanas, o evento de São Paulo teve como autor um aluno com histórico de problemas comportamentais e registros prévios de ameaça. Embora o adolescente possa também estar influenciado pelo extremismo promovido pelas redes sociais, seu comportamento não é tão raro no ambiente escolar. Segundo dados do PeNSE (2021), 39% dos alunos já relataram sofrer agressão verbal, 14% física e 11% já deixaram de ir à escola por insegurança no período de 30 dias anteriores à pesquisa. Alunos de 13 a 17 anos mencionaram, ainda, o envolvimento com lutas físicas (11%), uso de armas brancas (5%) e armas de fogo (3%).
Esses problemas aparecem sobretudo no 2° ciclo do ensino fundamental, fase em que os jovens passam por um profundo processo de transformação de hábitos e comportamentos. Nessa etapa, as estruturas cerebrais responsáveis pelo controle de impulsos estão em amadurecimento; logo, o comportamento tende a ser emitido de forma rápida e impensada. E o que fazer quando a família não consegue identificar distúrbios e prover atenção? A escola é o local onde os problemas aparecem e deve ser vista como base para os programas de prevenção à violência.
Hoje não temos elementos no currículo escolar voltados para ajudar os alunos a gerenciar emoções, a se comunicar de forma assertiva e a resistir à pressão dos pares. Contudo, existem experiências internacionais testadas com métodos rigorosos de avaliação que demonstraram serem capazes de reduzir o comportamento impulsivo e violento e prevenir o envolvimento com atos infracionais. Esses programas são compostos por oficinas com base em técnicas de Terapia Cognitivo Comportamental (TCC).
Inspirado por essas evidências, o Centro de Ciência Aplicada à Segurança da FGV —em parceria com o Naapa (Núcleo de Apoio e Acompanhamento para a Aprendizagem), da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, e o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania— desenhou e implementou o Programa Na Moral. O programa consiste numa série de oficinas lúdicas com base em TCC voltadas para alunos de 13 a 15 anos focada no desenvolvimento de habilidades socioemocionais. Em 2022, a primeira etapa do projeto foi implementada em 7 escolas e, neste ano, pretende-se expandir para até 40 unidades e submeter uma avaliação de impacto para testar sua efetividade.
A proposta é fornecer instrumentos que auxiliam na redução de comportamentos automáticos e impulsivos, interrompendo padrões de condutas violentas. Ao longo do programa, eles são incentivados a refletir sobre seus comportamentos, transformando tomadas de decisão rápidas e impulsivas em reflexões mais lentas e conscientes. Com isso, espera-se reduzir o comportamento violento e melhorar o desempenho escolar.
O tipo de violência que essa abordagem busca resolver é apenas uma das inúmeras manifestações de violência que estamos submetidos na nossa sociedade. O problema de ataques em massa é mais raro e requer outra abordagem. Como na medicina, precisamos saber diagnosticar as diferentes doenças, usar evidências científicas para desenhar soluções e testá-las para de fato comprovar se funcionam. O caminho é usar a ciência. A alternativa é contabilizar tragédias.
TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.