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Joana Monteiro, Rafael Aquino e Natalia Ribeiro

Um caminho para reduzir a violência nas escolas

Faltam elementos no currículo para alunos gerenciarem emoções e pressões

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Joana Monteiro

Doutora em economia, é professora da FGV/Ebape e coordenadora do Centro de Ciência Aplicada à Segurança Pública da FGV

Rafael Aquino

Doutor em bioquímica, é coordenador-executivo do Programa Na Moral

Natalia Ribeiro

Doutora em psicologia, é psicóloga responsável pelo desenho do Programa Na Moral

Nas últimas semanas, assistimos a casos de violência extrema dentro de escolas. Em São Paulo, um aluno de 13 anos matou uma professora e feriu outras cinco pessoas, enquanto em Blumenau (SC) um homem de 25 anos invadiu uma creche, matou quatro crianças e feriu outras quatro. Ouvimos após os eventos o receituário comum apresentado para lidar com problemas de violência no Brasil: colocar policiais, desta vez nas escolas, para controlar os efeitos do comportamento violento e impedir a aproximação de potenciais criminosos. Essa é a lógica intrínseca ao nosso modelo de segurança pública: não se busca afetar as causas estruturais do problema, mas estar pronto para reagir rápido quando ele é iminente.

O que pode ser feito para efetivamente reduzir a violência nas escolas? A primeira coisa é entender a estrutura do problema. Enquanto Blumenau lembra os ataques em massa às escolas norte-americanas, o evento de São Paulo teve como autor um aluno com histórico de problemas comportamentais e registros prévios de ameaça. Embora o adolescente possa também estar influenciado pelo extremismo promovido pelas redes sociais, seu comportamento não é tão raro no ambiente escolar. Segundo dados do PeNSE (2021), 39% dos alunos já relataram sofrer agressão verbal, 14% física e 11% já deixaram de ir à escola por insegurança no período de 30 dias anteriores à pesquisa. Alunos de 13 a 17 anos mencionaram, ainda, o envolvimento com lutas físicas (11%), uso de armas brancas (5%) e armas de fogo (3%).

Parentes e amigos fazem homenagem a vítimas do ataque à creche Cantinho Bom Pastor, em Blumenau (SC) - Bruno Santos - 6.abr.2023/Folhapress

Esses problemas aparecem sobretudo no 2° ciclo do ensino fundamental, fase em que os jovens passam por um profundo processo de transformação de hábitos e comportamentos. Nessa etapa, as estruturas cerebrais responsáveis pelo controle de impulsos estão em amadurecimento; logo, o comportamento tende a ser emitido de forma rápida e impensada. E o que fazer quando a família não consegue identificar distúrbios e prover atenção? A escola é o local onde os problemas aparecem e deve ser vista como base para os programas de prevenção à violência.

Hoje não temos elementos no currículo escolar voltados para ajudar os alunos a gerenciar emoções, a se comunicar de forma assertiva e a resistir à pressão dos pares. Contudo, existem experiências internacionais testadas com métodos rigorosos de avaliação que demonstraram serem capazes de reduzir o comportamento impulsivo e violento e prevenir o envolvimento com atos infracionais. Esses programas são compostos por oficinas com base em técnicas de Terapia Cognitivo Comportamental (TCC).

Inspirado por essas evidências, o Centro de Ciência Aplicada à Segurança da FGV —em parceria com o Naapa (Núcleo de Apoio e Acompanhamento para a Aprendizagem), da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, e o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania— desenhou e implementou o Programa Na Moral. O programa consiste numa série de oficinas lúdicas com base em TCC voltadas para alunos de 13 a 15 anos focada no desenvolvimento de habilidades socioemocionais. Em 2022, a primeira etapa do projeto foi implementada em 7 escolas e, neste ano, pretende-se expandir para até 40 unidades e submeter uma avaliação de impacto para testar sua efetividade.

A proposta é fornecer instrumentos que auxiliam na redução de comportamentos automáticos e impulsivos, interrompendo padrões de condutas violentas. Ao longo do programa, eles são incentivados a refletir sobre seus comportamentos, transformando tomadas de decisão rápidas e impulsivas em reflexões mais lentas e conscientes. Com isso, espera-se reduzir o comportamento violento e melhorar o desempenho escolar.

O tipo de violência que essa abordagem busca resolver é apenas uma das inúmeras manifestações de violência que estamos submetidos na nossa sociedade. O problema de ataques em massa é mais raro e requer outra abordagem. Como na medicina, precisamos saber diagnosticar as diferentes doenças, usar evidências científicas para desenhar soluções e testá-las para de fato comprovar se funcionam. O caminho é usar a ciência. A alternativa é contabilizar tragédias.

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