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O que a Folha pensa Congresso Nacional

PEC da Desfaçatez

Proposta que perdoa infrações de partidos é escândalo que rebaixa o Congresso

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Foto em contraluz da fachada do Congresso Nacional - Pedro França/Agência Senado

Não foi por acaso que a proposta de emenda à Constituição número 9/2023 ganhou, mesmo entre seus defensores, o apelido de PEC da Anistia. Com essa iniciativa, os parlamentares querem assegurar que permaneçam impunes irregularidades cometidas pelos partidos políticos no uso de dinheiro público nos últimos ciclos eleitorais.

Reconheça-se a qualidade da alcunha; talvez fosse melhor, contudo, chamar a proposta de PEC da Desfaçatez. Pois é disso que se trata: deputados e senadores não se pejam de modificar o texto constitucional com o único objetivo de se protegerem das punições que, tudo indica, eram líquidas e certas.

Em defesa do Congresso, diga-se que coerência não lhe falta. Essa não será a primeira vez que, num gesto de onipotência, ele não só pede perdão a si próprio como também o concede, garantindo que infrações às regras do jogo mereçam nada além de um profundo oblívio.

Mais que a repetição de um padrão imoral sob qualquer ponto de vista, o que chama a atenção são as cifras recordes envolvidas. Conforme mostrou reportagem da Folha, os partidos políticos, em conjunto, deram um calote de R$ 900 milhões em candidaturas de mulheres e de pessoas negras.

Pelas normas em vigor nas eleições de 2022, as agremiações estavam obrigadas a repassar recursos para mulheres e pessoas negras de forma proporcional à quantidade de candidaturas. Ocorre que, da direita à esquerda, do governo de turno à oposição, quase nenhuma legenda cumpriu esse ditame.

Que os políticos gostem ou não desse tipo de ação afirmativa é irrelevante. A eles compete produzir leis, não descumpri-las.

O caso das cotas nem é a única infração cometida quase à unanimidade. Há ainda a malversação do dinheiro público detectada pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Ao julgar com atraso as contas dos partidos relativas a 2017, a corte determinou a devolução aos cofres públicos de ao menos R$ 40 milhões, a título de ressarcimento e multa —valor que ainda precisa ser corrigido pela inflação.

Entre as situações mais graves está a do Pros, partido do qual quase ninguém se lembra e que foi incorporado ao Solidariedade neste ano. Pois essa agremiação nanica julgou oportuno queimar o dinheiro do contribuinte em itens como 3.700 quilos de carne, além da construção de uma piscina e da reforma da casa de Eurípedes Jr., que vem a ser ex-presidente do Pros.

A PEC da Anistia ainda está em tramitação no Congresso, o que significa que deputados e senadores ainda podem se corrigir. Caso não o façam, estarão dizendo para toda a sociedade que não têm escrúpulo de amesquinhar o valor da Casa a que pertencem.

editoriais@grupofolha.com.br

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