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Eduardo Oinegue

No STF, um inédito respiro de cinco anos

Intervalo até próximo indicado permitirá rara estabilidade em sua composição

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Eduardo Oinegue

Jornalista, é âncora do Jornal da Band e da BandNews FM, colunista do BandNews TV e sócio da Análise Editoria; foi redator-chefe da revista Veja e diretor de Redação da revista Exame

Vai fazendo as contas. Gilmar Mendes entrou no Supremo em 2002. Em 2003 foram indicados três ministros: Ayres Britto, Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. No ano seguinte, Eros Grau. Em 2006, mais duas indicações: Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski. Em 2007, Menezes Direito. Dias Toffoli foi indicado em 2009. Mais dois ministros em 2011: Luiz Fux e Rosa Weber. Em 2012, Teori Zavascki. Em 2013, o atual presidente, Luís Roberto Barroso. Em 2015, Edson Fachin. Alexandre de Moraes foi indicado em 2017. Em 2020, Nunes Marques; em 2021, André Mendonça. E, neste ano, duas indicações: Cristiano Zanin e, agora, Flávio Dino.

Estamos falando de 19 indicações em 21 anos, quase uma por ano. A título de comparação, nos EUA, no mesmo período, foram 11 indicações. Dos 19, 10 estão no Supremo, 6 se aposentaram (a última foi Rosa Weber, em setembro), 2 faleceram (Menezes Direito e Teori Zavascki) e Flávio Dino ainda será sabatinado.

Os ministros do Supremo Alexandre de Moraes (à esq.) e Gilmar Mendes e o ministro da Justiça, Flávio Dino, indicado à corte pelo presidente Lula - Pedro Ladeira/Folhapress - Folhapress

O ministro da Justiça, que obviamente será confirmado pelo Senado, pode vir a ser uma espécie de divisor de águas no tribunal depois desse período frenético de nomeações. Se nada acontecer, a próxima troca na corte só deverá ocorrer em 2028, no segundo ano do mandato do próximo presidente da Republica, com a aposentadoria de Luiz Fux.

De forma que talvez tenhamos o primeiro respiro de 5 anos em mais de 50 anos no tribunal. Esse intervalo de tempo, mais extenso que a duração de um mandato presidencial, permitirá ao STF experimentar uma rara estabilidade na sua composição. O que pode contribuir tanto para a dinâmica do funcionamento interno quanto para a relação da instituição com os outros Poderes.

Claro que a estabilidade no tribunal jamais poderá ser tomada como sinônimo de temperatura baixa nos debates. O Supremo Tribunal Federal foi criado em 1890. Já na sua primeira composição, presidida pelo Visconde de Sabará, havia registros de conflitos internos provocados pela convivência de uma ala que se considerava mais técnica e outra que defendia um olhar mais político sobre as matérias.

Conflitos com os demais Poderes também vêm de longe. Prudente de Moraes, primeiro presidente civil, chegou a enviar uma mensagem ao Congresso compartilhando a insatisfação dele com decisões do Supremo em defesa das liberdades individuais de adversários políticos. Hermes da Fonseca chegou a descumprir decisões do STF e defendeu para a Presidência da República a mesma competência para interpretar a Constituição.

No Brasil ou em qualquer país do mundo, os tribunais constitucionais lidam com interesses essenciais da sociedade, no campo dos costumes, da economia e da política. E isso mobiliza os formadores de opinião e os tomadores de decisão. É preciso ser ingênuo para esperar que a Alta Corte daqui ou de qualquer canto do planeta se comporte de maneira técnica, atendo-se a uma teórica e inexistente "interpretação literal" da Constituição.

Criado sob inspiração da Suprema Corte americana, o Supremo tem como uma de suas missões ser o último refúgio dos que têm os direitos individuais atacados pelo abuso do Estado. E ele faz isso com grande competência. O problema começa quando, na execução da tarefa, alguns ministros entendem que a função recebida guia-se por uma incumbência divina, não por determinação constitucional.

E tomam por ameaça qualquer iniciativa que os desagrade, como fizeram na lamentável reação à PEC que impede a declaração de inconstitucionalidade das leis por decisão monocrática. Que os próximos cinco anos do Supremo contribuam para a independência e a harmonia entre os Poderes, nos termos do artigo 2º da Constituição Federal.

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