Na CPI, Dominguetti erra sobre posts em defesa de Bolsonaro e apresenta áudio sem relação com vacina; veja checagem

Vendedor de vacinas que revelou pedido de propina prestou depoimento na comissão nesta quinta

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Agência Lupa

Em uma sessão conturbada, Luiz Paulo Dominguetti, representante da empresa Davati Medical Supply, prestou depoimento nesta quinta-feira (1º) à CPI da Covid no Senado. Ele havia afirmado em entrevista à Folha que recebeu pedido de propina de US$ 1 por dose de vacina contra a Covid-19, feito por um diretor do Ministério da Saúde, em troca de fechar contrato com o Ministério da Saúde.

Durante o depoimento, Dominguetti reafirmou o pedido de propina e apresentou um áudio que teria recebido de Cristiano Alberto Carvalho, que se apresenta como procurador da Davati no Brasil.

Segundo ele, a mensagem seria uma prova de que o deputado Luis Miranda (DEM-DF) tentava intermediar a compra de vacina. Tratava-se, no entanto, de uma gravação feita em 2020, sem relação com aquisição de imunizantes. O parlamentar e seu irmão, o servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, denunciaram irregularidades na tentativa de compra da vacina indiana Covaxin pelo governo federal.

Outros depoentes na CPI da Covid foram o empresário Carlos Wizard; o deputado federal Luis Miranda; o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS); o ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde Elcio Franco; o atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga; a médica Nise Yamaguchi; o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas; a secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro; e os ex-ministros da Saúde Eduardo Pazuello, Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, além do ex-chanceler Ernesto Araújo.

A Lupa verificou algumas das declarações de Luiz Paulo Dominguetti.

Veja, abaixo, a checagem.

O vendedor de vacinas Luiz Paulo Dominguetti durante depoimento na CPI
O vendedor de vacinas Luiz Paulo Dominguetti durante depoimento na CPI - Pedro Ladeira/Folhapress

A informação que eu sei é um [parlamentar]. Inclusive, com áudio dele tentando negociar vacina, a princípio, para o ministério

Luiz Paulo Dominguetti

Em depoimento na CPI

FALSO

O áudio apresentado por Dominguetti na CPI não tem qualquer relação com a venda de vacinas para o Ministério da Saúde. A mensagem foi enviada pelo deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) em 15 de outubro de 2020, ou seja, antes mesmo da conclusão dos ensaios clínicos de todas as vacinas contra a Covid-19. As mensagens tratam da venda de luvas nitrílicas, um tipo de luva descartável, para um indivíduo identificado como Rafael Luvas.

Miranda registrou ata notarial de certificado de conteúdo de conversa de WhatsApp nesta quinta-feira (1º), inclusive com a transcrição do áudio em questão e em nenhum momento é mencionada a negociação de doses de vacina, tampouco para o Ministério da Saúde.

Na conversa, o deputado diz, em 15 de setembro de 2020, data das primeiras mensagens, que não está falando como deputado, mas como empreendedor. Miranda envia dois arquivos PDF com a palavra “nitrile gloves” (luvas nitrílicas) no título, e que são reproduzidos posteriormente na ata. Os dois trocam outros áudios que não foram transcritos.

Mais adiante, já em 14 de outubro de 2020, Rafael Luvas envia uma mensagem: “Luiz (sic), Boa noite! Desculpa o horário. Estou com uma carga no chão dos eua a USD 19,25 - seco Se você tiver algum interesse conta com a gente Ótima noite”.

Na sequência, o deputado diz que precisa da prova de vida. Rafael responde que conseguiria direto com o dono da carga. O deputado responde, já no dia 15 de outubro de 2020, com o áudio em questão, apresentado à CPI, que é transcrito na ata.

Nessa gravação, ele reclama de alguns problemas que está tendo com um comprador. “Vou falar direto com o cara, o cara vai pedir toda a documentação do comprador, o comprador meu já está de saco cheio disso, vai pedir a prova de vida antes e a gente não vai fazer negócio”, diz. “Eu não vou mais perder tempo com esse comprador que desgastou muito nos últimos 60 dias, é muita conversa fiada no mercado, e aí eu não me sinto nem confortável.”

Ele diz ainda que tem um cliente que fechou contratos “com Walmart, com Walgreens [rede de farmácias norte-americanas], com as redes de restaurantes e alguns hospitais”. Em momento algum ele fala a palavra vacina. O áudio pode ser lido na íntegra no site do Senado.

Em nota, o advogado de Dominguetti, Flávio Moraes, diz que seu cliente recebeu o áudio de Cristiano Alberto Carvalho, da Davati, e que cabem a ele e a Miranda quaisquer explicações. Ele também disse que a gravação está sendo usada “como uma forma de desviar a atenção” das denúncias feitas pelo seu cliente.

Assim, o que acontece é: como houve a vinda do deputado [Luis Miranda] aqui, por causa de vacina, e o print que ele [Cristiano Alberto Carvalho, da Davati] enviou –e embaixo o áudio– sugestionava. Mas eu não posso fazer esse juízo de valor, se é ou não é

Luiz Paulo Dominguetti

Em depoimento na CPI

CONTRADITÓRIO

No início do depoimento, Dominguetti apresentou um áudio para a CPI e disse que seria prova de que o deputado Luis Miranda (DEM-DF) estaria negociando vacinas contra a Covid-19 com a Davati. “Eu tenho a informação de que parlamentar tentou negociar a busca por vacinas diretamente com a Davati, eu tenho essa informação”, disse.

Ele afirmou ainda que Cristiano Alberto Carvalho, que se apresenta como procurador da Davati no Brasil, disse que Miranda seria “o [deputado] mais insistente com a compra, intermediação de vacinas”.

Como explicado acima, o áudio apresentado à CPI não tem relação com compra de vacinas e foi gravado em 15 de outubro de 2020 —antes mesmo da aprovação da vacina contra Covid-19 da AstraZeneca por agências reguladoras e da publicação dos resultados da fase 3 de ensaios clínicos na revista The Lancet.

Em nota, o advogado de Dominguetti, Flávio Moraes, diz que não se deve “confundir a opinião do depoente sobre o áudio com a prova recebida e entregue”, pois a gravação foi enviada por Cristiano, e que cabe a ele explicar porque mandou esse áudio.

Que eu me recorde não [fiz postagem em rede social com crítica, elogio ou defesa do presidente da República ou do governo], Excelência

Luiz Paulo Dominguetti

Em depoimento na CPI

FALSO

Uma das publicações de Dominguetti é, inclusive, uma informação falsa sobre a jornalista Constança Rezende, repórter da Folha para quem ele deu entrevista na última terça-feira (29) e denunciou pedido de propina para compra de vacinas contra a Covid-19.

Em 10 de março de 2019, ele reproduziu uma postagem em que Bolsonaro atacava a jornalista, à época repórter do jornal O Estado de S. Paulo, e enganosamente atribuía a ela a afirmação de que sua intenção profissional “era arruinar Flávio Bolsonaro e o governo”. Essa informação foi desmentida, à época, pela Lupa.

O posicionamento pró-Bolsonaro também é evidente em publicações nas quais o empresário enaltece o ministro da Economia, Paulo Guedes. Ele também compartilhou conteúdos elogiando a atuação do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional do Brasil, o general Augusto Heleno.

Há diversas publicações também com críticas ao ex-presidente Lula, a parlamentares do PSOL e a políticos adversários de Bolsonaro, como Ciro Gomes (PDT) e a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS).

Vale pontuar que, no Facebook, o empresário e policial militar assina como Luiz Paulo Dominghetti, com “h”. Há, contudo, diversas fotos pessoais que demonstram que o perfil é autêntico. A última publicação foi em julho do ano passado.

Em nota, o advogado de Dominguetti, Flávio Moraes, diz que o depoente não movimentava sua conta no Facebook “há anos” — na verdade, ele parou de atualizar em julho do ano passado. “Isso não inviabiliza a denúncia efetuada contra o governo ontem. Pelo contrário, o credencia ainda mais”, disse.

Carol Macário , Marcela Duarte , Maurício Moraes e Nathália Afonso

Edição Chico Marés

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