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Derrota de Bolsonaro abre campanha de 2026 e desafia Lula

Ex-presidente no páreo era garantia de polarização; centrão será fiel da balança

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São Paulo

Se já era possível argumentar que a campanha de 2026 começou com a proclamação da vitória de Lula (PT) no segundo turno de 2022, a fragorosa derrota de seu rival Jair Bolsonaro (PL) no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) dá a largada oficial da corrida.

É a natureza da política, acentuada pela natureza do instituto da reeleição, que Lula testa de forma inédita ao voltar ao cargo pela terceira vez. Sua aprovação mediana e rejeição expressiva, que podem ou não serem revertidas se a economia melhorar, são sintomas do desgaste inerente da fórmula.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) fala com jornalistas após deixar sua casa na Barra da Tijuca, no Rio
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) fala com jornalistas após deixar sua casa na Barra, no Rio - Eduardo Anizelli - 29.jun.2023/Folhapress

Mas não é só isso, ou as agruras naturais de um país com muitas cordas esticadas.

O antipetismo que amalgamou-se com a antipolítica de 2013 a 2018, abrindo a porta para a aventura que foi o governo Bolsonaro, está vivíssimo, como a resiliente parcela da população que se declara bolsonarista —raiz ou não— prova.

Com isso, a didática aula de compostura institucional ministrada pelo TSE a Bolsonaro, na decisão por sua inelegibilidade por oito anos, traz sinais dúbios para os planos do petista para a campanha daqui a pouco mais de três anos.

Assim como a reabilitação dos direitos políticos de Lula pelo Supremo Tribunal Federal, em 2021, foi um bálsamo para um Bolsonaro acossado pela má-gestão da pandemia e o sentimento de crise sem fim que se vivia sob sua Presidência, o derrota do presidente por seu golpismo tira de Lula um ativo importante.

Como na dinâmica dos quadrinhos, heróis precisam de vilões que os definam. E, sem aqui escolher quem está de qual lado, Lula e Bolsonaro se completam por ofertar exatamente o que sua posição retórica tem de melhor na visão do adversário: um demônio a culpar.

Se há dúvidas acerca dessa lógica, basta ver a exígua margem de 2.139.645 votos em favor de Lula no dia 30 de outubro passado. As adesões de lado a lado refluíram, e as pesquisas mostram que, refeitas as margens naturais das fronteiras ideológicas e pragmáticas, o país segue bastante cindido.

Isso favorece tanto o presidente quanto o antecessor, adeptos de retóricas incendiárias quando o tema é fustigar o inimigo. Por evidente, não se equivale a disposição de Lula em relação às tais instituições democráticas: por mais que ele se esforce em falar disparates, não atentou de forma objetiva contra elas como Bolsonaro.

A abertura do campo sem Bolsonaro, é preciso ressalvar, se fará com ele em estridência máxima. Até com mulheres jornalistas da Folha ele passou a falar, tal a necessidade de não encarar o oblívio. Como elemento único da direita nacional nas últimas décadas, um populista popular como Lula, o ex-presidente ficará na paisagem, mas a falta de palanque tende a fazê-lo esmaecer aos poucos.

Aqui, vale o "hedge" atribuído ao ex-ministro Pedro Malan (Fazenda) sobre o Brasil, país onde até o passado é incerto. Para ficar em Lula, sua carreira parecia encerrada quando adentrou a carceragem da Polícia Federal em 2018. Olhe onde ele dorme hoje, isso para não falar no criação da figura do mártir político, que Bolsonaro explora habilmente desde a facada naquele mesmo ano.

Há também a particularidade da seita bolsonarista, que evidentemente já equivale o julgamento finalizado nesta sexta (30) ao juízo de Pôncio Pilatos. Para esse segmento, não existe nada além da verdade revelada pelo Messias, no caso Jair.

Mas o ex-presidente não é nenhum Fernando Collor, basicamente um pária público quando teve sua elegibilidade cassada em 1992, e retém um capital cuja resistência à erosão ainda tem de ser testada.

Considerando que tudo fique onde está, a falta de horizonte político de Bolsonaro tende a lhe custar caro.

Ele nunca teve grupo: havia a família e os agregados, todos pouquíssimo profissionais do ramo até hoje. Quem o é, a parcela do centrão que tomou de assalto (sem trocadilhos, claro, ou não) seu governo para salvá-lo da implosão após a apoplexia golpista de 2021, está neste momento fazendo contas.

As eleições do ano que vem não são uma boa régua. O PL pode até executar seu plano de engorda, mas ele terá pouco a ver com faniquitos ideológicos. Basta apelar a lógicas municipais e temperá-las, onde isso cola mais como centros urbanos densos, com antipetismo.

Pleitos locais são deveras peculiares, indicam uma tendência aqui e outra ali, mas não são bússolas certeiras.

Daí que as casas de apostas da política já estão em pleno vapor, buscando o nome que irá substituir Bolsonaro. Novamente: a antipolítica que levou o deputado irrelevante e radical ao poder não existe neste momento como força, e é possível especular que mesmo o eleitorado bolsonarista raiz possa abraçar nomes mais moderados.

O resto é o que se sabe: o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) tem a gravidade de liderar São Paulo a seu favor, nomes como Romeu Zema (Novo-MG) e Eduardo Leite (PSDB-RS) têm difíceis pretensões nacionais, fora especulações que vão de Ratinho Jr. (PSD-PR) a Michelle Bolsonaro (PL), passando por Tereza Cristina (PP-MS).

Há até espaço para fantasiar, como brinca um dirigente partidário, como pensar numa chapa conservadora encabeçada pelo atual vice de Lula, Geraldo Alckmin (PSB), secundado pelo algoz de Bolsonaro, o ministro do Supremo Alexandre de Moraes.

Mas isso é conversa fiada a essa altura. O que é certo é que Lula terá trabalho para modular sua persona pública sem um Bolsonaro para lhe fazer altura em decibéis. O ativo de "salvador da democracia", aspas compulsórias, não conseguiu sobreviver ao crédito extra que lhe foi dado pela crise do 8 de janeiro. Isso, claro, se ele for o candidato em 2026, como a lógica supõe.

Um nome que vendesse moderação, perfil que está sendo trabalhado por Fernando Haddad (PT), talvez tivesse menos problemas nesse quesito —o que faltou até agora para o ministro da Fazenda foi voto desde que deixou a prefeitura paulistana.

Outra aposta evidente é que o centrão, seja na nova versão montada com o PSD e o MDB à frente, ou no sabor tradicional Arthur Lira (PP-AL), será o fiel de qualquer balança apresentada. E que ela estará assentada no binômio desempenho da economia-popularidade do presidente, já que parecem abandonados planos mais ambiciosos de governo em si.

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