Deputados falam sobre suas trajetórias acadêmicas e como entraram na política

Veja os depoimentos de Tabata Amaral, Felipe Rigoni, Vinicius Poit e Isa Penna

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São Paulo

De direito a engenharia, conheça a trajetória acadêmica de quatro jovens políticos que concorrem a cargos nas eleições deste ano.

Tabata Amaral (PSB-SP), 28, Felipe Rigoni (União Brasil-ES), 31, Vinicius Poit (Novo-SP), 36, e Isa Penna (PC do B-SP), 31, contam como usaram o aprendizado das universidades no dia a dia de seus mandatos.

Ilustração de Ricardo Ampudia para a capa do caderno Guia das Profissões
Ricardo Ampudia

‘Quando estava no ensino médio, não sabia nada de política’

Tabata Amaral, 28, deputada federal e candidata à reeleição (PSB-SP)

Tudo começou em 2005 com a Olimpíada Brasileira de Matemática de Escolas Públicas. Eu estava na quinta série e tive a sorte de ter uma professora que preparou a gente para a competição. Fui medalhista de prata e, depois, ganhei uma bolsa no colégio Etapa.

Com 14 anos, comecei a dar aulas aos domingos em escola pública. Porque, antes, eu estudava em uma escola estadual. Cresci numa ocupação na periferia de São Paulo. Não conhecia a aven ida Paulista nem o parque Ibirapuera e, de repente, estava estudando numa das melhores escolas particulares da cidade. Minha vida passou a ficar muito diferente das pessoas da minha comunidade. Então, dar aula foi a resposta que eu pude dar a essa desigualdade.

Meu pai era dependente químico e ficou muito mais doente quando eu estava no ensino médio. Ficou difícil permanecer na escola. Mas meus professores me deram todo o apoio. Eles pagaram o meu almoço e o meu transporte. Com isso, participei de mais de 40 Olimpíadas do Conhecimento e fui para cinco olimpíadas internacionais na equipe brasileira. Isso tudo foi criando em mim a vontade de ser cientista.

No colégio, vi uma palestra sobre o MIT (Massachusetts Institute of Technology). Daí veio o sonho de fazer faculdade fora do país. Saí de um lugar em que eu nem considerava fazer faculdade para o lugar em que Harvard e MIT passavam a entrar no meu horizonte.

Tabata Amaral durante audiência na Câmara
Tabata Amaral durante audiência na Câmara - Billy Boss - 25.mai.22/Câmara dos Deputados

Quando eu estava no segundo ano, os meus professores conseguiram uma bolsa para mim em uma escola de idiomas. Meu inglês era muito fraco, mas o processo seletivo americano é mais amplo que o brasileiro. Você pode contar a sua história, e os seus professores escrevem cartas [de recomendação].

Aqui no Brasil, prestei três vestibulares e só fui aprovada em um, o de física na USP (Universidade de São Paulo). Nos Estados Unidos, passei nas seis melhores faculdades com bolsa completa.

Quatro dias depois de eu ter passado em Harvard, perdi meu pai para as drogas. Ele sempre foi o meu maior incentivador. Foi um baque muito grande, mas meus professores não me deixaram largar esse sonho.

Quem estuda em Harvard, no primeiro ano, passa por oito áreas do conhecimento. Você só declara o major (graduação principal) e o minor (secundária) no terceiro semestre. Fiz várias aulas e aí acabei decidindo trabalhar com educação. Mudei meu major para ciência política, e o meu minor ficou sendo astrofísica.

Então, testei um pouco de tudo. Fui para a Índia por dois meses num projeto de educação científica. Criamos o Mapa Educação, que é um movimento de jovens ativistas do Brasil inteiro. Fui para Sobral (CE), que começava a aparecer como a cidade com melhor educação básica do país.

Eu era uma pessoa que sabia que queria trabalhar com educação e entender como poderia dar uma contribuição maior. E essa jornada me fez olhar para a política pela primeira vez.

Quando eu estava no ensino médio, não sabia nada de política. Achava aquilo que a gente costuma ouvir, que é coisa de bandido, de quem não presta. Mas a política é sobre nós. A gente precisa aprender sobre ela e ocupar esse lugar.

Felipe Rigoni durante audiência na Câmara
Felipe Rigoni durante audiência na Câmara - Alan Rones - 6.jul.22/Câmara dos Deputados

‘Consegui me formar como um bom tomador de decisões’

Felipe Rigoni, 31, deputado federal e candidato à reeleição (União Brasil-ES)

Sempre fui bom de conta, desde pequeno. Depois que fiquei cego [aos 15 anos], fiquei muito melhor, inclusive. Sempre fui muito conectado às exatas.

Quando tive que decidir a minha graduação, prestei engenharia de produção na UFES (Universidade Federal do Espírito Santo) e física na UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto), que foi onde fiz faculdade. Cursei um ano de física, mas depois resolvi mudar para engenharia de produção lá na mesma universidade. Sou filho de empreendedores, então sempre tive uma conexão forte com essa coisa de liderança e gestão de empresa.

Terminei a faculdade em 2014 e sinto muito orgulho do curso que eu fiz. Nunca atuei na área, mas ter essa formação me ajuda muito em várias coisas. Porque é uma engenharia de método, de gerenciamento, de linha de produção, de pesquisa operacional e de entrega. Ela ensina como gerar resultados em um processo produtivo, que pode ser de uma indústria, de um serviço ou mesmo de uma lei.

Lá na faculdade, participei da empresa júnior de engenharia de produção. Fui ascendendo como liderança e cheguei a ser presidente do conselho da Confederação Brasileira de Empresas Juniores. Isso me ajudou não só a desenvolver a minha capacidade de líder e de realizar projetos, mas a entender as coisas de uma forma mais global.

Também tive outra formação importante, apesar de banalizada no Brasil, que é a de coaching. Fiz um monte de cursos nessa área e, quando voltei para Linhares (ES), minha cidade natal, abri uma empresa nesse ramo.

O que me levou para a política foi perceber que, se eu quisesse transformar a vida das pessoas, precisaria mudar as oportunidades que elas tinham. Em 2016, fui candidato a vereador na minha cidade e perdi. Graças a Deus! Porque, com isso, tive a oportunidade de me preparar melhor.

Em 2017, conquistei uma bolsa e fui fazer mestrado em políticas públicas na Universidade de Oxford, na Inglaterra. Lá, passei por várias áreas do conhecimento: leitura de evidência, ciência política, filosofia política, economia, direito, tudo. Com isso, você constrói na cabeça um sistema de tomada de decisão.

O mestrado lá funciona em quatro trimestres. Os três primeiros são de conteúdo e o último é para desenvolver o projeto de verão, que é uma espécie de estágio avançado em política pública. O meu foi a minha campanha a deputado federal, que saiu vitoriosa.

Com essa trajetória, consegui me formar como um bom tomador de decisões, que é o que eu faço essencialmente como deputado. Consigo entender, desenhar e gerir processos, que são ensinamentos da engenharia de produção e do coaching. Isso é superimportante para um político.

Um bom político precisa ter duas características: visão global e flexibilidade. Precisa ter visão global dos problemas e não ser alguém que só entende um pedaço das coisas, porque isso leva a decisões muito ruins. E precisa ter a capacidade de ser flexível, porque as coisas mudam muito o tempo inteiro.

Vinicius Poit durante debate entre candidatos ao Governo de SP
Vinicius Poit durante debate entre candidatos ao Governo de SP - Marlene Bergamo/Folhapress

‘Política é um mestrado em saber conversar com todo mundo’

Vinicius Poit, 36, deputado federal e candidato ao governo de São Paulo (Novo-SP)

Tive uma origem de gente muito empreendedora, meus avós e meus pais. Quando fui escolher a faculdade, falei: "Qual curso eu faço para aprender a fazer negócio?".

Nem sabia que o nome disso era empreender. Mas tinha essa vontade de ser vendedor. Vi que a Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas era referência. Então, pensei: "É lá que vou tentar passar".

Nasci em São Bernardo do Campo e morava em Santo André. Fui fazer cursinho lá na Consolação (centro de São Paulo). Entrei na FGV no meio de 2004. E aí começou a transformação.

Venho de uma família que começou do zero e guardo essas origens. Convivi muito com meus avós por parte de pai que moravam no interior. Era uma cultura de quem viveu no sítio e passou necessidade.

Quando cheguei à FGV, por mais que a gente tivesse uma condição financeira melhor naquela época, percebi um contraste muito grande. Vi que a oportunidade de estudar ali era muito única. Foi aí que começou essa vontade de impactar a sociedade e retribuir.

Comecei a ser voluntário na ONG Canto Cidadão [num projeto em que visitava hospitais públicos caracterizado de palhaço]. Depois, passei a fazer um trabalho com pessoas em situação de rua. Eu enxergava resultado, mas também via que aquilo era enxugar gelo.

Vendo as movimentações de rua de 2013 e depois o impeachment [da presidente Dilma Rousseff], entendi que para ter impacto a ferramenta era a política. Em 2016, me filiei ao Partido Novo.

Paralelamente a isso, trabalhei por quatro anos no Citibank, montei uma consultoria de reestruturação de empresas e um site de recrutamento online. Quando me elegi deputado federal, em 2018, fiquei só como acionista de alguns negócios e me dediquei 100% ao meu mandato.

Usei conceitos da faculdade para trazer níveis de transparência e prestação de contas que nunca tinham sido feitos antes. Fui o primeiro parlamentar a ser contemplado com o selo Portal da Integridade, conferido pelo Ibra (Instituto Brasileiro de Rastreamento de Ativos).

Bom, e o que eu fiz? O básico. Fazia planejamento estratégico todo ano. A gente tinha metas, para ir acompanhando mensalmente.

Montei um sistema que se chama Emendas Inteligentes. Não tem protocolo físico. É tudo pela internet, com nível de transparência máximo. Com isso, pus o nível de execução de emendas em 100%.

Também criei um medidor de satisfação do cliente, vamos dizer assim. No mercado de startups, que é de onde eu venho, isso se chama NPS (Net Promoter Score). Então, pedia para que os meus eleitores me dessem nota todo mês. Aí, tomava ações dentro das críticas que eles me faziam.

Tudo isso você aprende na faculdade. Mas, como política não é igual empresa, tem uma coisa que aprendi mais no mandato: dialogar com pessoas bem diferentes. Conversando com colegas do parlamento de outros partidos, aprendi na prática o que é construir mais pontes e menos muros.

A base de empreendedor ajuda a saber conversar com todo mundo. Agora, a política é um mestrado nisso.

A deputada estadual Isa Penna
A deputada estadual Isa Penna - Divulgação

‘Fiz direito porque queria dedicar a minha vida à militância’

Isa Penna, 31, deputada estadual e candidata a deputada federal (PCdoB-SP)

Eu venho de um ambiente, desde pequena, em que a militância pelo que é coletivo, por igualdade e por justiça social já era muito presente. Eu tive essa oportunidade.

Amava teatro, mas escolhi fazer direito porque queria ser militante. Eu queria dedicar a minha vida a isso mesmo. Na época, jamais passava pela minha cabeça ser deputada.

Entrei na PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) em 2009. Na primeira semana de aula, recebi um panfleto de um coletivo do movimento estudantil e já fui participar da primeira reunião. Depois disso, eu não parei mais. Participei muito do centro acadêmico. Fiz muito essa parte política, porque o direito é a expressão da realidade. Então, acima de tudo, para você entender o direito, você precisa entender a realidade.

O primeiro lugar em que eu estagiei foi no escritório Dom Paulo Evaristo Arns, da PUC, que atuava em favelas da cidade de São Paulo. Tinha dois projetos de formação de direitos e também de regularização fundiária.

Depois disso, fui para um instituto que trabalhava pegando denúncias de tortura e fazendo pedidos de liberdade provisória [de detentos]. Duas vezes por semana, eu fazia o meu trabalho das 7h às 17h no CDP (Centro de Detenção Provisória) de Pinheiros.

Aí, acabei conhecendo o sindicato dos professores de Guarulhos. Lá, passei bons tempos profissionais e aprendi muito. Também atuava como advogada de mulheres e era do movimento feminista.

Fui para um escritório de advocacia e, quando eu estava prestes a ser efetivada como sócia, disse para a minha chefe que tinha decidido ser candidata pelo PSOL, porque achava que era uma ideia melhor. [Em 2014, Isa Penna concorreu ao cargo de deputada estadual, mas não se elegeu.] Naquele ano, eu também me formei e passei na prova da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

Em 2016, eu fiquei como primeira suplente [do vereador Toninho Vespoli] e [durante 30 dias, em março de 2017] assumi como vereadora. Em 2018, a minha candidatura a deputada estadual foi uma decisão coletiva, de um grupo do qual eu fazia parte.

A coisa foi ganhando uma proporção maior por conta da luta e de momentos em que eu fui combativa desde a Câmara Municipal. Descobri que seria candidata no fim de junho e a campanha seria em agosto. Foi um tiro no escuro que deu certo.

Venho de uma trajetória política de atuar em prol das mulheres e contra todas as formas de violências supremacistas e antidemocráticas que existem na nossa sociedade, ou seja, machistas, racistas, LGBTfóbicas e classistas. Basicamente, é assim que eu atuo como deputada.

Os conhecimentos do direito também ajudam muito no meu dia a dia hoje. Eles são importantes para saber o que é competência estadual, quais são os instrumentos legais que eu tenho se quiser questionar algo, se eu precisar de uma liminar rápida, como despachar com um juiz. Obviamente, não consigo ser mais a única advogada do meu mandato, mas já tenho o caminho das pedras.

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