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Em novo livro, Ottolenghi ensina a deixar os vegetais mais saborosos

Em entrevista, chef fala sobre receitas e técnicas criadas em parceria com Ixta Belfrage, cozinheira cuja mãe é brasileira

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São Paulo (SP)

Quantas maneiras existem de preparar uma berinjela? Para o chef anglo-israelense Yotam Ottolenghi, são várias, mas ele não cansa de descobrir outras mais.

Amante incondicional de vegetais e autor premiado de uma dezena de livros de culinária, o chef dedicou o mais recente deles às maneiras de transformar esses ingredientes em pratos cheios de sabor —palavra que dá nome ao livro que acaba de chegar ao Brasil pela Companhia das Letras.

"Neste novo livro, falamos sobre como extrair o máximo de sabor dos vegetais, seja marinando, refogando ou infusionando para criar camadas de sabor", disse Ottolenghi em entrevista à Folha.

Chef de cozinha Yotam Ottolenghi
Yotam Ottolenghi: em novo livro, chef ensina como deixar os vegetais saborosos e irresistíveis - Reprodução

Escrito em parceria com a chef Ixta Belfrage, nascida no Reino Unido e com mãe brasileira, "Sabor" guia o leitor a explorar os vegetais a partir de técnicas (como tostar, dourar e maturar), das combinações (de doçura, gordura, acidez e picância) e das referências que a dupla coleciona em décadas cozinhando pelo mundo.

Entre as receitas de "Sabor", Ottolenghi destaca a de banana-da-terra com salada de coco, maçã e gengibre, inspirada nas vivências de Ixta no Brasil, e a couve-flor assada com manteiga de pimenta que, segundo ele, é um ótimo exemplo da versatilidade do seu vegetal favorito.

Apesar da sua paixão pelos vegetais, Ottolenghi conta que seus filhos pequenos ainda estão desvendando sabores e texturas —um deles, de sete anos, não suporta tomate cru. "Mas a pior maneira de convencer alguém é pedir que eles entrem de cabeça", diz o chef.

Seu novo livro sugere "uma nova maneira de pensar processos, combinações e ingredientes". Que nova maneira é essa? Essencialmente, "Sabor" é uma coleção das receitas que Ixta Belfrage, coautora do livro, e eu desenvolvemos na nossa cozinha de testes, com novas ideias e novos sabores ao cozinhar os vegetais. É um livro muito inspirado nos sabores que a Ixta experimentou ao crescer no México, no Reino Unido e no Brasil, onde ela tem família, e nas influências do Oriente Médio, de onde eu venho. É uma celebração dos vegetais.

Logo na introdução, você apresenta "20 ingredientes de sabor" que representam a essência do livro. Por quê? Essencialmente, essa é uma lista de ingredientes que te permitem incorporar sabores intensos aos vegetais —que é justamente a história desse livro. Usamos muitas pimentas, que vêm da paixão da Ixta pela comida mexicana, mas também do Oriente Médio, como a pimenta Aleppo, e da América do Sul, como a pimenta ancho. O Oriente Médio, aliás, está sempre presente através do cardamomo, dos limões. O vinagre e o vinho de arroz trazem um pouco da Ásia também.

Você diz que vegetais podem se transformar muito entre um prato e outro. Qual deles é o mais versátil? A couve-flor, que tem a habilidade de se transformar completamente conforme a técnica utilizada. No livro, tem uma receita de couve-flor assada com manteiga de pimenta que diz muito sobre versatilidade: conseguimos alcançar uma boa profundidade de sabor simplesmente temperando e assando a couve-flor —a mesma coisa que faríamos com um pedaço de frango ou de pernil. Felizmente, as pessoas estão redescobrindo a couve-flor e as várias maneiras de prepará-la, seja assada, grelhada, no vapor ou até crua, ralada em saladas.

Talvez as pessoas não gostem por causa daquele cheiro estranho que ela tem ao ser cozida. A couve-flor é como o repolho: se você cozinhar ela em água por muito tempo, vai soltar esse cheiro ruim de enxofre. Ao invés disso, você pode cozinhá-la em água por alguns minutos, e então assar ou grelhar para concentrar o sabor. Assim, não tem cheiro ruim. Isso serve para muitos vegetais: você cozinha rapidinho, e depois grelha. Assim, eles ficam firmes por dentro, mas macios e ligeiramente queimadinhos por fora, o que traz um sabor incrível e um bom contraste de texturas.

Como despertar a vontade de comer vegetais? Os vegetais, assim como os c ogumelos, são incrivelmente gostosos e versáteis, mas podem ficar meio aguados se você não souber como prepará-los. Um simples choque de calor pode trazer um sabor que não estaria ali. Então, o problema não são os vegetais, mas o quanto as pessoas estão por dentro do que é possível fazer com eles. Um exemplo disso é o homus, que é muito famoso, muita gente ama, mas… como fazer um homus bem suave e macio? Você precisa saber como trabalhar o grão-de-bico.

Por que é importante aprender técnicas de cozinha? Quando as pessoas ouvem essa palavra, logo pensam que é um nível de cozinha que não é para elas. Mas até mesmo ao fritar um ovo você aprende que, se usar bastante óleo e bem quente, as bordas vão ficar queimadinhas e crocantes. Isso é uma técnica. Outras são mais complicadas, como a emulsificação, mas quando você pega o jeito consegue fazer molhos deliciosos e sedosos. Toda vez que você cozinha algo, está aprendendo técnicas. Na próxima vez que for fazer algo semelhante, já tem esse repertório. Essa é a mágica.

O Brasil tem uma forte cultura alimentar, mas os ultraprocessados ganham cada vez mais espaço, como no Reino Unido. Qual a importância de cozinhar? Ir ao mercado e comprar algo pronto é muito tentador, mas o nosso corpo não foi desenhado para digerir molhos prontos ou temperos em pó. Eles são atalhos para o sabor, sem os nutrientes que o nosso corpo precisa. Você pensa que está comendo comida de verdade, mas está enganando seu corpo. E os efeitos são palpáveis como a obesidade, por exemplo.

É possível criar coisas muito mais deliciosas e nutritivas se você cozinhar em casa. Precisamos construir nossos próprios sabores. Um exemplo disso é um ragu que faço para os meus filhos. É como um molho à bolonhesa, mas vegetariano, feito com lentilhas, tomate, alho, harissa, missô, cogumelos, cevada, cominho… O missô é um atalho para turbinar o sabor, mas ele é um fermentado natural, um produto que, ainda que processado, não tem nada artificial adicionado.

Seus filhos gostam de vegetais? Como qualquer criança, eles começam não gostando de muitas coisas. Acho que eles estão aprendendo a gostar de sabores mais complexos. Minha política é de nunca brigar. O de sete anos, odeia tomate cru, por exemplo. Não ligo tanto para isso porque a pior maneira de convencer alguém é pedir que eles entrem de cabeça. Mas crianças precisam, sim, ser expostas à boa comida.

No livro, você diz que a Ixta é uma ótima contadora de histórias. O que você aprendeu com ela sobre a cozinha brasileira? Ixta sempre fala sobre as cozinhas de onde ela cresceu, o que inclui a Itália, o México e o Brasil, que inclusive inspirou uma das receitas do livro: a de banana-da-terra com salada de coco, maçã e gengibre. E também me apresentou a uma sobremesa brasileira que eu gosto de chamar de "trufas" [o brigadeiro]. É absolutamente delicioso. Ela ama a cultura e a comida daí. Diz que é o lugar mais vivo do mundo. Infelizmente eu nunca tive a chance de visitar, mas quero muito conhecer.

Sabor

  • Preço R$ 199,90 ( 320 págs.)
  • Autor Yotam Ottolenghi e Ixta Belfrage
  • Editora Companhia de Mesa
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