Reunião com Guedes deixa Congresso frustrado com falta de medidas para conter crise do coronavírus

Percepção dos parlamentares foi a de que o governo não está dimensionando corretamente os efeitos da crise sobre a atividade econômica

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Brasília

Líderes partidários que participaram da reunião de emergência realizada na noite de quarta-feira (11) na Câmara dos Deputados saíram do encontro frustrados com a falta de anúncios de medidas econômicas para conter a crise gerada pelo coronavírus e aprofundada pela guerra do preço do petróleo.

Os parlamentares deixaram o encontro alarmados com a dimensão da crise sanitária e econômica e há um certo clima de se trabalhar pela liberação dos recursos necessários para o Ministério da Saúde, deixando em segundo plano embates com o governo e a disputa pelo controle de uma significativa fatia do Orçamento 2020.

A percepção dos parlamentares foi a de que o governo não está dimensionando corretamente os efeitos da crise sobre a atividade econômica. Eles criticaram ainda o que consideraram uma postura equivocada do Executivo diante da situação.

Para o ministro Paulo Guedes (Economia), o momento exige uma postura reativa do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) e seria mais prudente “esperar o problema acontecer” antes de anunciar medidas pontuais de contenção de danos.

Paulo Guedes (Economia) deixa o prédio do ministério em Brasília - Adriano Machado - 9.mar.2020/Reuters

Guedes teria ainda desenhado um cenário econômico distante da realidade, o que contrariou líderes. Depois, ao apresentar os impactos do covid-19 na economia, traçou um quadro mais pessimista.

No mesmo dia em que a equipe econômica revisou de 2,4% para 2,1% a sua projeção para o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) para 2020, Guedes disse que, no pior cenário, o avanço seria de 1%, menor do que o 1,1% de 2019. Seria o quarto ano seguido de baixo crescimento.

"Primeiros estudos nossos: se for uma coisa suave, 0,1 [ponto percentual] de perda de PIB. Se for uma coisa mais grave, pode chegar a 0,3, 0,4 até 0,5 [p.p de corte]", disse Paulo Guedes na reunião com os parlamentares.

"Se, ao contrário, a pandemia tomar conta do Brasil e nós não fizermos as nossas reformas, pode chegar até 1%", disse.

Mesmo diante destas projeções, o ministro da Economia não apresentou medidas de efeito imediato, o que deixou os parlamentares indignados.

“Achamos que, diante desse momento de crise, o governo deveria oferecer um cardápio de iniciativas. E tem que ser o governo. Nós vivemos num presidencialismo. Embora nós tenhamos tido um protagonismo importante do Parlamento, o regime é presidencialista e cabe ao presidente tomar iniciativas”, afirma o líder do Cidadania na Câmara, deputado Arnaldo Jardim (SP).

Para deputados de partidos de centro que participaram do encontro, Guedes perdeu a capacidade de negociar com o Congresso; eles passaram a defender uma substituição do ministro. Além da fraca interlocução, Guedes tem também perdido respaldo no mercado, avaliam.

Além da reunião emergencial, o governo fez mudanças na articulação política junto ao Congresso. O ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) participou do encontro no Congresso, mas, desgastado com líderes de partidos do chamado “centrão” —como PP, DEM, Solidariedade, MDB e PL—, foi escanteado por Bolsonaro por causa das falhas nas negociações do acordo que repartiu R$ 30,8 bilhões do Orçamento com os parlamentares.

Na interlocução com parlamentares na crise do coronavírus, Bolsonaro decidiu colocar o ministro Jorge Oliveira (Secretaria-Geral da Presidência), que teria perfil mais técnico e ajudaria a elaborar os termos da medida provisória para liberar imediatamente R$ 5,1 bilhões para o combate ao coronavírus.

Na tarde desta quarta, após o Congresso derrubar um veto de Bolsonaro ao BPC (benefício concedido a idosos carentes e deficientes), segundo relatos, Guedes bufou em seu gabinete reclamando da articulação política do governo, que não conseguiu garantir a vitória ao Executivo.

O revés na decisão de Bolsonaro acarretará em novas despesas de R$ 20 bilhões para os cofres públicos.

O senador Eduardo Gomes (MDB-TO), líder do governo no Congresso, quer reunir os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) e Bolsonaro para discutir as medidas de combate.

A ideia do senador é que o encontro acontecesse ainda nesta quinta-feira (12) para que a MP fosse editada logo em seguida. Alcolumbre, no entanto, viajou com um grupo de parlamentares para o Amazonas nesta manhã.

A medida de caráter orçamentário emergencial atende a demanda do ministro Luiz Henrique Mandetta (Saúde) por recursos. Na quarta, em audiência no Congresso, o ministro solicitou aos deputados e senadores que destinassem a verba para o combate à pandemia por meio das emendas de relator.

A crise do coronavírus e a derrota sofrida pelo governo na derrubada do veto ao BPC devolveram mais uma vez as negociações sobre a divisão dos R$ 30,8 bilhões à estaca zero.

Líderes de partidos de centro haviam pedido às suas bancadas para manter o veto de Bolsonaro, mas o esforço fracassou, ele acabou sendo derrubado, e o governo estima um aumento de R$ 20 bilhões nas despesas por ano.

A derrota foi vista como uma articulação desastrosa do governo Bolsonaro no Congresso e embaralhou a retomada das discussões para a divisão do Orçamento —que nas últimas semanas gerou uma crise entre os Poderes.

Apesar da derrota imposta ao governo na ampliação do BPC, o clima não é pela aprovação de mais projetos que elevem despesas federais. Em períodos de disputa entre Poderes, é comum que parlamentares desengavetem projetos antigos que desagradam o governo.

Mas líderes do Congresso rejeitam essa ideia, que poderia comprometer ainda mais o plano de Guedes de tentar ajustar as contas públicas. A proposta de tornar permanente o 13º do Bolsa Família e para quem recebe o BPC ainda será avaliada, pois o impacto fiscal é de quase R$ 8 bilhões por ano.

Sob impasse, a votação em plenário para definir a divisão desses recursos ficou para a próxima semana, só depois das manifestações marcadas para domingo (15) em defesa de Bolsonaro e com ataques ao Legislativo e ao Judiciário.

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