Descrição de chapéu LGBTQIA+

Drag queens inspiram negócios que oferecem experiência de diva a cliente

Salão de beleza e bar que propõem transformação por um dia buscam criar ambientes com diversidade

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Sorocaba (SP)

Há dez anos Aysla Freitas, personalidade drag queen de Rafael Vieira, 32, faturava R$ 100 por apresentação nas noites da cidade de Sorocaba, interior de São Paulo. Apaixonado por maquiagem, ele conciliava suas performances com o trabalho de atendente de telemarketing e investia parte do salário nas habilidades com maquiagem.

Um amigo cabeleireiro o chamou para trabalhar como assistente em um salão, e Vieira se destacou pelo trabalho e pela simpatia.

Vestido de camiseta preta, Rafael está com os braços cruzados e segura um pincel de maquiagem na mão direita. Cabelo com topete e barba aparada
Rafael Vieira, 32, é proprietário do L'Equipe Aysla Freitas - Arquivo pessoal

"Eu fui o primeiro a fazer masterclass de maquiagem na cidade. Isso gerou um boom muito grande e comecei a ganhar fama. Aí falei para a dona do salão: ‘Não dá mais para eu ser só assistente, tenho muitos clientes’", conta.

Ele pegou dinheiro emprestado com uma amiga para comprar equipamentos e ocupou um espaço em definitivo no salão. Mas não foi só isso. Apesar da boa clientela, o espaço enfrentava dificuldades financeiras. Os donos da época resolveram vender o negócio, e Rafael não deixou passar a oportunidade.

Evangélico, pediu uma confirmação a Deus para assumir o salão. "Ele me deu um sinal e aceitei a proposta. Tinha 99% de certeza que daria certo." E deu. Ele superou dívidas iniciais que chegavam a R$ 60 mil e hoje é proprietário do maior salão de Sorocaba, o L’Equipe Aysla Freitas.

Com 35 funcionários, quatro andares, mais de mil metros quadrados, estacionamento, elevador, um andar apenas para noivas e outro para estética, a empresa atende mais de mil pessoas por mês, incluindo drag queens, com faturamento anual na casa de R$ 1 milhão.

"Não quero um salão elitizado nem um salão todo desorganizado. A gente trabalha para ter todos os tipos de público e dar o melhor atendimento a cada um", afirma. O espaço já atraiu famosos como a dupla Maiara e Maraísa.

Vieira diz que pensa em expandir o negócio e abrir uma segunda unidade em outra cidade ou até mesmo em outro país. Para futuros empreendedores, o maquiador deixa uma dica. "Você pode ter o dinheiro que for, o espaço que for, se não tiver uma boa administração, uma boa equipe, de nada adianta."

Quem também se arriscou no mundo dos negócios foi o casal Matheus Nahas, 39, e Luis Fernando Spaziani, 52, criadores da Casa Fluída , um restaurante, bar e ateliê localizado na capital paulista que atende o público LGBTQIA+.

"Prezamos muito pela diversidade. Aqui tem gay novo, bicha velha, tem o senhor hétero, tem drags, travestis, e transformistas", diz Spaziani.

A ideia do negócio veio porque a casa deles servia de ateliê para Spaziani, onde aconteciam exposições de artes plásticas, com curadoria dele, e festas para amigos. "Era inusitado as pessoas estarem em um ateliê de arte, tomando um drink, se divertindo", diz.

Passiflora, nome drag de Carlos Rivera é maquiada por Mahina Starlight, na Casa Fluida, em São Paulo.
Passiflora, nome drag de Carlos Rivera é maquiada por Mahina Starlight, na Casa Fluida, em São Paulo. - Lucas Seixas/Folhapress

Mas antes de transformarem o ateliê-bar em negócio, eles passaram por uma experiência drag queen e decidiram incluir essa forma de expressão no novo empreendimento. Ambos foram convidados para uma festa na casa de um amigo e ali foram incentivados a se montar e a fazer uma apresentação entre eles.

Encontraram, no entorno da rua Augusta, na região central de São Paulo, uma casa de três andares. Compraram e reformaram o imóvel, com investimento de R$ 1,2 milhão, em meio à pandemia.

"Anexamos ao projeto original da casa, que era bar, restaurante, ateliê e as festas. E aí juntamos a experiência drag", conta Spaziani.

A casa tem uma drag residente, Mahina Starlight, responsável por fazer as transformações nos clientes.

"Para mim, é o ponto alto da noite. Todos os dias, praticamente, tem experiência drag", afirma Nahas.

O serviço custa R$ 130 e dá direito a uma transformação e a uma performance no palco com uma drag profissional convidada. Ao final, o cliente ainda recebe uma certidão de batismo drag.

Segundo os fundadores, já foram feitas 223 transformações. A lista inclui uma mulher de 70 anos e uma menina de 15 anos.

O negócio, aberto em setembro de 2021, deu certo. Spaziani pediu demissão do banco em que trabalhava havia 35 anos para se dedicar exclusivamente à Casa Fluida. Já Nahas, que é professor de química, deixou duas das três escolas em que dava aula.

Hoje, o espaço tem 15 funcionários e funciona de quarta a sábado, das 18h à 1h30, com capacidade para atender 150 pessoas por noite, que pagam R$ 5 para entrar.

Para os proprietários, a paciência é essencial para ter um bom empreendimento. "Você tem que ir com calma e empreender naquilo que gosta", afirma Nahas.

Atualmente, há mais de 1,4 milhão de empresas no setor de beleza no Brasil, segundo o Sebrae-SP, sendo 1,2 milhão de MEIs (microempreendedores individuais).

Segundo Renata Malheiros, coordenadora do Programa Plural do Sebrae, para trabalhar no planejamento de negócios como esses, é necessário avaliar as competências técnicas e as socioemocionais.

"Planejamento, finanças, marketing, gestão… Ser bom nessa parte técnica não faz de ninguém um bom empresário. Você precisa ser bom em um outro conjunto de competências, que são as socioemocionais. Tem muito mais a ver com como você foi criado, como você se percebe no mundo, como o mundo percebe você", afirma.

Hoje, o órgão conta com dois programas, o Sebrae Delas e o Programa Plural, que deve começar em 2024, segundo Malheiros. Por meio dessas iniciativas, o público pode realizar cursos, consultoria, capacitação e mentoria focados em diversidade.

"Pessoas de grupos subrepresentados ou minorizados tendem a enfrentar obstáculos adicionais nas competências socioemocionais."

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