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Entenda conflito no Sudão que já matou mais de 500 pessoas

Disputa entre generais que lideram Forças Armadas e grupo paramilitar mergulha país em crise profunda

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São Paulo

O Sudão está mergulhado em um conflito que começou no dia 15 e já deixou mais de 500 mortos até aqui.

Os generais Fatah al-Burhan, líder do país, e Mohamed Hamdan Dagalo, conhecido como Hemedti, do grupo paramilitar RSF (Forças de Apoio Rápido), discordam sobre a participação dos paramilitares no Exército e disputam a formação de um eventual governo de transição.

Essas são as principais divergências dos antigos aliados que, juntos, derrubaram a ditadura de 30 anos de Omar al Bashir em 2019 e, agora, colocaram o Sudão numa onda de violência que também já deixou mais de 4.200 feridos. A ONU descreveu a situação atual do país como uma catástrofe humanitária.

Entenda o que está em jogo na disputa e seus desfechos até aqui.

A cidade de Cartum, capital do Sudão, durante conflito entre generais - 20.abr.23/AFP

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Como estava o Sudão antes do conflito?

Os combates começaram depois de meses de tensão entre os líderes do Exército sudanês e das RSF. Rumores sobre um confronto entre os soldados de al-Burhan e de Hemedti circulavam havia meses.

Os antigos aliados uniram forças para derrubar em 2019 o ditador Omar al-Bashir, que liderou o país por três décadas. A instabilidade aumentou em 2021, quando os generais participaram de um golpe de Estado que prendeu o então premiê, Abdallah Hamdok, e encerrou a transição para um regime democrático.

O golpe motivou protestos em defesa da democracia e contra o regime. Hamdok, que voltou ao cargo após um acordo com as forças de segurança, renunciou em janeiro do ano passado, depois de dezenas de pessoas serem mortas em manifestações. À época, Hamdok admitiu ter fracassado na tentativa de alcançar um consenso e afirmou que diferentes forças políticas do Sudão estavam "fragmentadas demais". Desde então, as divergências as facções só aumentaram. Disputas de militares pelo poder são comuns na história do Sudão, um dos países mais instáveis politicamente em todo o mundo.

Quais são as causas do conflito?

Os gatilhos para o início dos combates foram divergências dos generais al-Burhan e Hemedti sobre a participação dos paramilitares nas Forças Armadas —embora não houvesse rejeição à integração do grupo ao Exército, o regime queria impor condições e limitar seu escopo de atuação. As facções comandadas pelos dois generais ainda disputam a formação de um novo governo de transição.

Os atritos ficaram mais evidentes no início do mês, quando um trato para transição à democracia deveria ter sido assinado. Quando os combates começaram, houve acusações em torno de quem iniciou a crise.

Quem são as partes envolvidas?

Analistas estimam que as RSF têm cerca de 100 mil soldados em todo o país. O grupo tem origem nas chamadas milícias janjaweed, acusadas de terem cometido atrocidades na região de Darfur nos anos 2000. À época, soldados foram convocados pelo então ditador, Omar al-Bashir, a reprimir uma rebelião liderada por povos não árabes. Estima-se que 300 mil pessoas foram mortas no conflito.

Com o passar do tempo, o grupo cresceu e passou a ser usado como guarda de fronteira, principalmente para reprimir a migração irregular. Em 2017, foi aprovada uma lei que legitima o grupo paramilitar como força de segurança independente. Depois, em 2019, após a destituição do ditador, o general Hemedti assinou um acordo de compartilhamento de poder que o tornava o número dois no comando do Sudão.

O número um é o general al-Burhan, que controla o Exército sudanês.

Qual é a situação atual do conflito?

Desde o início dos combates, ataques aéreos e de artilharia mataram ao menos 512 pessoas e feriram quase 4.200 até esta quarta (26). As ofensivas também destruíram hospitais e limitaram a distribuição de alimentos —um terço da população de 46 milhões de pessoas já dependia de ajuda humanitária.

A Organização Mundial da Saúde disse que apenas 16% das instalações de saúde estavam funcionando em Cartum e projetou "muito mais mortes" devido a doenças e à escassez de alimentos, água e serviços médicos. Estima-se que 50 mil crianças com desnutrição aguda tiveram o tratamento interrompido devido ao conflito, e os hospitais que ainda funcionam enfrentam falta de suprimentos, energia e água.

O Sudão está em guerra civil?

Especialista em dinâmicas de segurança na África e doutorando em relações internacionais, Lucas de Oliveira Ramos afirma que, por ora, não. As partes envolvidas não declararam uma guerra formal e tampouco têm projetos antagônicos definidos. Além disso, não há clareza sobre as demandas dos grupos envolvidos, que concentram os combates na capital e nos arredores.

Os acordos de cessar-fogo funcionam?

Todas as tréguas acordadas entre os dois lados fracassaram. Ainda que oficialmente em vigor, nenhum plano de cessar-fogo funcionou completamente, visto que os ataques continuaram.

As tentativas de interromper o conflito envolvem principalmente os EUA, mas também abrangem, por exemplo, a União Africana, fórum que reúne 55 países do continente. O plano vigente nesta quarta-feira (26) tampouco trouxe avanços concretos. Um dos lados, o do general al-Burhan, aprovou a extensão da trégua oficial por mais 72 horas, em vão. Além da ineficácia do acordo, no entanto, as Forças de Apoio Rápido não haviam respondido publicamente à proposta até a noite desta quarta (26).

Como a comunidade internacional reagiu aos acontecimentos?

Tanto os EUA como seus rivais no xadrez global, China e Rússia, pediram o fim imediato das hostilidades, assim como organizações multilaterais como ONU e União Europeia, além do papa Francisco, que afirmou estar rezando para que "as armas fossem abaixadas".

Em 24 de abril, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, manifestou preocupação em relação à atuação de forças externas no Sudão. Segundo Blinken, responsável pela diplomacia dos EUA, militares do Grupo Wagner, uma organização mercenária russa, ameaçam agravar o conflito. O grupo nega envolvimento nos combates atuais, mas é acusado de ter relações comerciais com o país africano.

O ministro das Relações Exteriores da Finlândia, Pekka Haavisto, manifestou preocupação semelhante. Segundo ele, ao se desvencilhar diplomaticamente, o Ocidente pode permitir que a Rússia ganhe influência no Sudão. No início de abril, Helsinque passou a integrar a Otan, a aliança militar ocidental.

Enquanto isso, diversas missões continuam empenhadas em resgatar cidadãos estrangeiros. Ao todo, mais de mil cidadãos da União Europeia foram retirados do Sudão desde o início do conflito, disse o chefe da diplomacia do bloco, Josep Borrell. Já o Itamaraty informou que dez brasileiros conseguiram fugir do país atravessando a fronteira com o Egito depois de uma longa viagem em um micro-ônibus.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou para o risco de uma "conflagração catastrófica", afirmando que o conflito poderia se espalhar para outros países. "Devemos fazer tudo o que está ao nosso alcance para tirar o Sudão da beira deste abismo."

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