Ian Bremmer

Fundador e presidente do Eurasia Group, consultoria de risco político dos EUA, e colunista da revista Time.

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Descrição de chapéu Eleições EUA

O que vai acontecer se Donald Trump vencer as eleições americanas

Republicano mudou debate dentro da política para reenergizar um isolacionismo que não se via mais em Washington

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E se Trump vencer? Essa é a pergunta que os governos ao redor do mundo estão se fazendo agora. O ex-presidente tem pelo menos chances iguais de reconquistar a Casa Branca. Mas mesmo que Trump seja a mesma pessoa carismática, impulsiva, abrasiva e negociadora que era há quatro anos, o mundo ao seu redor se tornou um lugar mais obviamente perigoso.

Donald Trump promove evento de campanha no Forum River Center, na Geórgia - Chip Somodevilla - 9.mar.24/Getty Images via AFP

Como presidente de 2017 a 2021, Trump obteve alguns sucessos notáveis na política externa –um acordo de livre comércio revitalizado da América do Norte, os Acordos de Abraão, uma divisão mais justa dos custos da Otan, novas e mais fortes alianças de segurança na Ásia– mas duas guerras, uma China em desaceleração, uma economia global lenta e o desenvolvimento surpreendentemente rápido e acelerado da inteligência artificial farão exigências inteiramente novas à sua liderança.

Em relação à China, um segundo mandato de Trump significaria uma mudança na abordagem dos Estados Unidos, de modo a se tornar mais confrontativa. Começando com o retorno de Robert Lighthizer, o duro czar do comércio de Trump, e um novo impulso contra aliados dos EUA como Japão e Coreia do Sul para renegociar termos comerciais e de segurança com sua administração. O sucesso da abordagem de Trump dependerá quase que inteiramente de como Pequim responderá.

O líder chinês, Xi Jinping, pode decidir que sua estratégia de maior, embora ainda limitado, engajamento falhou e que os Estados Unidos nunca poderão ser um parceiro de negociação previsivelmente confiável. Ou ele poderia decidir que as perspectivas econômicas de longo prazo da China exigem uma abordagem mais conciliatória, apresentando a Trump algumas vitórias políticas notáveis. Seja o que acontecer, um segundo mandato de Trump criaria tanto maiores riscos nas relações com a China quanto maiores oportunidades do que um segundo mandato de Biden.

Na Otan, Trump enfraquecerá a aliança transatlântica. Sua convicção de que todos os membros europeus cumpram as promessas feitas décadas atrás de gastar no mínimo 2% do seu PIB em sua própria defesa será mantida –e não é irracional. Por que, ele pergunta, se a Rússia representa uma ameaça à segurança tão grave à Europa, os líderes europeus precisaram da invasão da Ucrânia para fazer um compromisso mais sério de defender seu continente?

A maioria dos países da Otan não estará disposta ou será capaz de cumprir as condições de gastos mais altos que Trump estabelece. É improvável que Trump tente retirar os EUA da aliança, sejam quais forem as ameaças que ele faça, mas os aliados na Europa e os inimigos no Kremlin terão motivos para duvidar do compromisso do governo Trump de defender os parceiros da aliança sob ataque. E os líderes europeus não terão tempo ou vontade política para construir a "autonomia estratégica" que o Emmanuel Macron tem instado para fortalecer a autodefesa da Ucrânia –uma grande vitória para Vladimir Putin. Os Estados da Otan mais próximos das fronteiras da Rússia têm motivos para se preocupar.

No Oriente Médio, Trump pode desempenhar um papel mais estabilizador. Os Acordos de Abraão, provavelmente a maior conquista de política externa de seu primeiro mandato, normalizaram as relações entre Israel e alguns de seus vizinhos árabes, estabelecendo condições para uma região mais estável e próspera. Também expôs a indiferença quase total que os governos árabes ricos sentem em relação aos palestinos. Os ataques terroristas do Hamas em outubro de 2023 e a resposta esmagadora de Israel a eles colocaram essa esperança –e a perspectiva de que até a Arábia Saudita possa fazer um acordo com Israel– em espera indefinida. Em um segundo mandato de Trump, seus instintos negociadores e fortes relacionamentos com líderes árabes do Golfo poderiam reviver essa possibilidade.

A falta de inibição de Trump em atacar diretamente o Irã –lembra-se do assassinato direcionado do chefe de defesa iraniano Qassem Suleimani por sua administração?– também poderia criar riscos imprevisíveis. Mas o Irã não tem interesse em um confronto direto perigoso com os EUA ou Israel que não possa vencer, especialmente quando uma derrota poderia criar uma crise interna. Mesmo nos EUA, a abordagem de Trump é mais provável do que as medidas meio-termo do governo Biden para resultar em uma ruptura na forma de novas concessões que são principalmente positivas para o Oriente Médio e sua estabilidade.

Um segundo governo de Trump também tentaria fazer novos acordos, tanto em segurança de fronteiras quanto em política comercial, com a provável próxima presidente do México, Claudia Sheinbaum, sucessora preferida do presidente López Obrador. A revisão prevista do acordo comercial EUA-México-Canadá em 2026 pode fazer com que as relações tenham um início controverso, mas ambos os lados sabem que os EUA têm toda a vantagem de negociação nesse caso, e a economia manufatureira do México se beneficiará da abordagem mais agressiva de Trump em relação à China. Poucos previram que Trump poderia construir um relacionamento pragmático mutuamente benéfico com Obrador, que poderia ajudar Sheinbaum e Trump a construir confiança.

Finalmente, Kim Jong-un, da Coreia do Norte, certamente ficaria feliz em receber de volta Trump, o único presidente dos EUA disposto a negociar com ele, e Trump continua intrigado com a oportunidade contínua de fechar o acordo que ele acredita que nenhum outro presidente dos EUA possa conseguir –referente ao programa nuclear norte-coreano. Isso é uma má notícia, é claro, para a Coreia do Sul e seu presidente belicoso Yoon Suk-yeol, que pode ter pouco a dizer sobre o que Trump oferece a Kim em troca de um acordo.

Mas a preocupação maior para os aliados dos EUA diante das eleições de novembro é a incerteza sobre a confiabilidade de longo prazo do governo mais poderoso do mundo. Ganhando ou perdendo, Trump mudou o debate dentro da política americana para reenergizar um isolacionismo que não havia ganhado força em Washington desde antes da Segunda Guerra Mundial. Essa é uma nova realidade assustadora que não depende do resultado das eleições.

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