Governo diz que economizou e cita PCC e segurança para justificar voos de Doria

Tucano usou aeronaves pagas pelo governo em 2 a cada 3 dias com compromissos externos

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São Paulo

O Governo de São Paulo disse em nota que os deslocamentos do governador João Doria (PSDB) seguem "critérios de segurança, transparência e moralidade" e apontou como justificativa para os voos riscos ao tucano após a decisão de transferir líderes do PCC (Primeiro Comando da Capital) para presídios federais.

A gestão afirmou também que Doria reduziu gastos com traslados aéreos em 2019 na comparação com 2018, ano em que o governo foi comandado por Geraldo Alckmin (PSDB) e Márcio França (PSB).

A Secom (Secretaria de Comunicação) ainda chamou de especulações "suposições de que agendas de governo seriam realizadas para viabilizar compromissos políticos ou pessoais".

A Folha mostrou que o governador usou aeronaves pagas pelo governo em 2 a cada 3 dias com compromissos externos, fez agendas casadas e também transportou aliados. No total, ele fez 435 trajetos.

"Não preciso desse tipo de benesse de governo", disse Doria nesta quarta-feira (15), após a publicação da reportagem, ao ser questionado em entrevista coletiva sobre as caronas.

A primeira-dama, Bia Doria, que também tem direito ao transporte aéreo, acumulou 22 voos feitos para atendê-la, sem contar as vezes em que embarcou como acompanhante do marido.

"Todos os deslocamentos do governador, terrestres ou aéreos, são planejados e executados pela Casa Militar, seguindo critérios de segurança, transparência e moralidade, de acordo com o decreto estadual nº 48.526, de 2004", afirmou a Secom.

"A norma estadual vigora há 15 anos e estabelece de forma clara as possibilidades do uso de aeronaves. A frota de aeronaves da PM teve uso de apenas 1,7% das suas horas voadas, realizadas em 2019, para o transporte do governador."

Segundo o Palácio dos Bandeirantes, houve diminuição de 33% nas horas voadas no ano passado, em relação a 2018. Doria acumulou 120,9 horas voo, ante 180,4 horas no ano anterior, somando ​os períodos de Alckmin (janeiro a abril) e França (abril a dezembro).

"A hora voada no helicóptero EC 135, biturbina [de prefixo PR-GSP], que é a aeronave mais utilizada em deslocamentos aéreos, custa R$ 3.900,00, o que representa uma economia de 60% em relação ao valor da hora voada em voos fretados, de acordo com valor de R$ 9.900 praticado no mercado", disse.

De acordo com o governo, para os deslocamentos em que a equipe de segurança julgar necessário, o governador e o vice-governador Rodrigo Garcia (DEM-SP) utilizam o helicóptero PR-GSP, que, quando está em manutenção, pode ser substituído por outra aeronave.

O valor total economizado por Doria não foi informado. O estado também não explicou se há regras para caronas ou se as autoridades podem convidar qualquer um para embarcar.

Sobre segurança, a nota sustenta que no ano passado foram reforçadas as medidas de proteção a Doria e a Garcia, após a transferência de 37 chefes do PCC e a decisão de intensificar o combate ao crime organizado.

"Esse foi o primeiro de diversos duros golpes no funcionamento da facção criminosa, com apreensão recorde de cocaína, armas, veículos e aeronaves de traficantes", acrescentou.

De acordo com o governo, o reforço do esquema de segurança "foi feito para garantir a integridade física da autoridade pública, de seus familiares e a instituição pública".

O governador João Doria (PSDB) ao desembarcar de voo locado pelo estado para cumprir agendas em Barretos (SP), em 8 de janeiro de 2019
O governador João Doria (PSDB) ao desembarcar de voo locado pelo estado para cumprir agendas em Barretos (SP), em 8 de janeiro de 2019 - Governo do Estado de São Paulo

"Todos os deslocamentos e viagens aéreas, sem exceção, em que o governador e demais dignitários utilizaram aeronaves públicas ou locadas pelo governo foram realizados para cumprir compromissos funcionais e otimizar tempo de agenda", segue o texto.

Além disso, houve a intenção de "preservar a segurança dessas pessoas, que, como poucas, vêm enfrentando facções criminosas e reduzindo drasticamente os índices de criminalidade em São Paulo".

O comunicado afirmou que todas as agendas e deslocamentos são pautados pelo interesse público e estão à disposição no site do governo e no Serviço de Informações ao Cidadão (SIC). "Por isso, não passam de especulações as suposições de que agendas de governo seriam realizadas para viabilizar compromissos políticos ou pessoais."

Também "estão à disposição da população, no Diário Oficial, com absoluta transparência" as informações sobre aeronaves do governo e sua manutenção.

"João Doria é o primeiro governador de São Paulo a custear voos de helicópteros com recursos próprios, por meio de sua aeronave pessoal", disse o governo. O tucano é dono de um helicóptero Bell 429 com capacidade para oito pessoas, usado "em agendas pessoais, pontualmente, em fins de semana".

O governador, afirmou o Bandeirantes, abriu mão de prerrogativas do cargo, como o direito de morar no palácio, que não é mais residência oficial —ele vive em sua própria casa, no Jardim Europa (zona oeste).

"Além disso, ele doa mensalmente seu salário de governador para entidades reconhecidas pelo trabalho social e assistencial", completou a Secom, citando AACD, Casa Hope, Graac e Associação Paulista Feminina de Combate ao Câncer, entre outras.

primeira-dama Bia Doria foi procurada, mas sua assessoria disse que a resposta seria enviada pela Secretaria de Comunicação do Bandeirantes. O governo não esclareceu questões específicas sobre ela.

Doria desembarca em São Roque (SP) do helicóptero PR-GSP, que pertence ao governo e é usado para o transporte de autoridades; no local, governador participou de inauguração de aeroporto privado voltado à aviação executiva
Doria desembarca em São Roque (SP) do helicóptero PR-GSP, que pertence ao governo e é usado para o transporte de autoridades, em 16 de dezembro de 2019; no local, governador participou de inauguração de aeroporto privado voltado à aviação executiva - Cadu Rolim - 16.dez.2019/Fotoarena

A Folha também procurou passageiros sem ligação direta com o governo que foram transportados.

O médico Alexandre Senra disse que sua presença na viagem a Minas pode ser explicada por sua relação com o governador. Ele ressaltou ser um "profissional com cerca de 28 anos de formado e experiência", que tem Doria como paciente.

"Acredito que isso basta para justificar minha presença nesta viagem", afirmou o cirurgião plástico, acrescentando que o fato de ter o tucano "como amigo e paciente é conhecido por todos".

A Via Jap Comércio de Veículos Ltda. disse que os voos de helicóptero para o almoço em Nova Lima e para a reunião com Romeu Zema foram oferecidos a Doria sem custo.

A VB Comunicação afirmou, em nota, que promove há dez anos o Conexão Empresarial e que o evento "é realizado de acordo com as boas práticas do mercado e normas vigentes".

O médico Claudio Lottenberg informou, via assessoria, que foi chamado para um atendimento de emergência no Albert Einstein enquanto estava no funeral e que Doria lhe ofereceu a carona, já que o hospital fica ao lado do Bandeirantes, para onde o governador iria se deslocar.

Bruno Araujo disse que nas datas dos voos abandonou "compromissos de ordem pessoal e profissional para tratar com o governador João Doria de questões de interesse do estado de São Paulo". O presidente do PSDB citou como exemplo a tramitação no Congresso da lei do saneamento.

A assessoria do presidente da Assembleia, Cauê Macris, afirmou que o deputado é um agente público e que o fato de ele acompanhar o governador "em algumas ocasiões não infringe a legislação específica".

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, disse que pegou carona no helicóptero de Doria ao sair de um evento onde os dois estavam porque sua agenda seguinte era uma reunião com o governador paulista no Bandeirantes. Foi "questão de logística", afirmou via assessoria.

A corretora de seguros Rosani Salanitri foi acionada por meio da equipe da irmã, mas não se manifestou.

Joice Hasselmann afirmou que participou do voo porque houve "agendas compatíveis da primeira-dama e da deputada".

"De acordo com o decreto estadual nº 48.526, de 2004, por ser agente pública, a deputada federal tem prerrogativa para realizar tal viagem sem infringir a legislação específica", disse.

O chef Erick Jacquin foi indagado se sua presença no projeto do Fundo Social foi condicionada à oferta de traslado até o local do evento em Santo André, o que negou.

Via assessoria, disse que "não houve nenhum tipo de contrapartida em sua participação, que foi decidida apenas porque acredita em iniciativas que tragam retorno social e promovam a gastronomia". Ele afirmou que seu interesse era estimular a iniciativa.

Viviane Senna não comentou a carona na volta de Campos do Jordão, mas a assessoria do Instituto Ayrton Senna disse que ela integra o conselho estadual de gestão da educação e já esteve em outras agendas com Doria.

Raquel Gerde não respondeu à reportagem.

Carlos Sampaio disse nunca ter voado com o governador Doria, "em nenhuma ocasião", contestando o dado oficial.

Questionada sobre a nota enviada à Folha pela gestão Doria, a assessoria de Márcio França afirmou que ele "nunca usou o contrato de locação de aeronaves privadas, nem para voos no estado, ao Distrito Federal ou ao exterior".

E acrescentou: "Se Doria decidiu ir ao exterior várias vezes no ano passado, deve ter sido necessário e importante".

Sobre o inquérito do Ministério Público, o ex-governador reiterou que obedeceu às regras e seguiu "o que foi determinado pela competência da Casa Militar".

"O governador de São Paulo, um dos estados mais importantes do mundo, deve ter o direito de se deslocar com segurança e rapidez para onde entender necessário, observando sempre os meios que a lei permite e sob a fiscalização dos órgãos de controle", disse França.

O ex-governador Alckmin informou que, durante sua gestão, o estado vendeu um avião a jato e um helicóptero, que ficavam à disposição do governador. "Eu fui aos 645 municípios paulistas e, muitas vezes, ia de carro. Ou ia com o avião King Air, que é da Polícia Militar", disse.

Alckmin afirmou ainda que ia a Brasília e voltava em voo de carreira.

A respeito de Lu, disse que não se pode comparar os voos dela com os de secretários porque os auxiliares não costumavam usar voos para seus compromissos. Ele informou que a mulher, como presidente do Fundo Social, firmou convênios com 400 municípios e teve 200 mil alunos em cursos profissionalizantes.

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