Descrição de chapéu Eleições 2022

Do Novo ao PSOL, partidos expõem rachas com pré-candidaturas à Presidência em 2022

Amoêdo desiste de ser postulante a presidente pelo Novo; divergências táticas e ideológicas multiplicam apresentações de nomes em legendas

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São Paulo

As piadas que exploram a ambivalência da palavra "partido" para descrever o clima em certas legendas andam em voga a um ano e três meses da eleição presidencial de 2022. Siglas da direita à esquerda vivem uma fase de multiplicação de pré-candidaturas e oposição de alas.

No episódio mais recente, o Novo anunciou o lançamento de João Amoêdo, que concorreu ao Planalto em 2018, como o escolhido para entrar na disputa, mas um grupo de filiados discordou e tentou emplacar o deputado federal Tiago Mitraud (MG), escancarando divergências internas.

Diante da crise, Amoêdo informou na noite desta quinta-feira (10) ter declinado do convite aceito por ele e divulgado no dia 1º deste mês. O empresário apontou como justificativa a "ausência de um posicionamento transparente, firme e célere" do Novo, o que "demonstrou a falta de unidade" quanto ao propósito para 2022.

No PSOL, o deputado federal Glauber Braga (RJ) apresentou sua pré-candidatura com o apoio de correligionários para se contrapor à corrente que descarta postulante próprio do partido em 2022 e defende apoio ao ex-presidente Lula, que se encaminha para ser o candidato do PT.

Em uma fase mais avançada, o racha no PSDB —expressão até batida do noticiário político— será resolvido com prévias, cujos detalhes começaram a ser definidos nesta semana. No quadro atual, o governador de São Paulo, João Doria, que há anos mira a Presidência, tem três adversários.

Presente, em maior ou menor grau, no entorno de praticamente todos os aspirantes ao cargo, a cisão partidária só não atinge o candidato à reeleição. E por uma razão óbvia: Bolsonaro se mantém sem filiação partidária, embora tenha sinalizado sua entrada no Patriota.

No caso do Novo, uma ala se rebelou contra o anúncio, feito no dia 1º, de que Amoêdo havia aceitado o convite feito por 36 dos 40 integrantes da convenção nacional para ser pré-candidato. O empresário e fundador do partido teve mais de 2,6 milhões de votos e ficou em quinto lugar.

Amoêdo, que declarou voto em Bolsonaro no segundo turno, mas agora se diz arrependido (faz oposição ao governo e defende o impeachment), foi fustigado por parlamentares federais da sigla, tidos como alinhados ao presidente e interessados em não romper com o eleitorado bolsonarista.

O motim levou a um impasse interno, exposto em redes sociais e mensagens internas vazadas à imprensa. Mitraud, que declarou não ter a intenção de concorrer, mas também não se opôs à articulação, precisaria de no mínimo 21 assinaturas em apoio a seu nome, o que não ocorreu.

O Novo informou nesta quinta à noite que, com a desistência de Amoêdo, "seguirá trabalhando na construção de uma alternativa ao bolsopetismo para 2022".

"Agradecemos todo o inestimável esforço de João Amoêdo, que se dedica há mais de uma década para a construção e consolidação do Novo", disse a legenda em uma rede social.

Na terça-feira, Amoêdo disse à Folha que, quando recebeu o convite, sua "compreensão era a de que seria para ser o pré-candidato, não participar do processo seletivo com outros nomes". Para ele, a proposta que havia recebido excluía a possibilidade da apresentação de outros concorrentes.

Envolvido na fabricação de uma terceira via, ele afirmou na ocasião não ter "fixação por ser candidato", mas disse defender que o partido tenha representante para sentar à mesa de negociações.

Em mensagem enviada a colegas de sigla nesta quinta, Amoêdo explicou que recuou da decisão "após avaliar os acontecimentos subsequentes ao anúncio" da candidatura.

"Muito me orgulharia representar o Novo neste momento tão importante para o nosso país, mas não há como iniciar essa dura caminhada sem a condição por mim citada quando da aceitação desse convite", escreveu.

E acrescentou, entre aspas, o trecho: "Mas aceito essa tarefa confiando que trabalharemos como um time, com resiliência, alinhamento, humildade e coerência, dentro dos princípios, valores e propósitos que justificaram a fundação do Novo".

"Continuarei trabalhando na construção de um País melhor para todos", concluiu.

Também na terça, Mitraud afirmou à reportagem que a proposta de sua pré-candidatura estagnou diante da ausência de apoios suficientes e negou a pecha de bolsonarista atribuída à bancada federal. Uma das leituras é a de que os deputados teriam receio de perder votos da base de apoio do presidente em suas tentativas de reeleição em 2022.

"Acho que o Novo tem se apresentado como uma opção que continua representando o desejo de parte da população que votou em Bolsonaro em 2018 [em relação à agenda liberal], mas sem ser o Bolsonaro, sem arrastar aqueles problemas todos que ele simboliza", disse o mineiro.

Em 2020, um racha no partido culminou na revogação da candidatura de Filipe Sabará a prefeito de São Paulo, depois de elogios dele a Bolsonaro e suspeitas de irregularidades.

O ambiente também é de cisão no PSOL. Braga e o grupo de parlamentares que endossou o lançamento de sua pré-candidatura, em maio, distanciaram-se do núcleo do ex-presidenciável Guilherme Boulos, que é expoente da ala majoritária e entusiasta da negociação de uma aliança com Lula.

O líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), que é pré-candidato a governador de São Paulo, defende a união da esquerda nos planos nacional e local.

A briga dos dissidentes é para que o PSOL recuse a aproximação de forças de centro-direita que estão sendo procuradas pelo petista. Pregam ainda que, como faz desde sua fundação, em 2004, o partido apresente um rosto para o pleito presidencial, com um projeto fiel a princípios da esquerda.

"O apoio à nossa pré-candidatura está só aumentando", diz Braga. Ele tem a seu lado, inclusive, a deputada federal Luiza Erundina (SP), que foi vice na chapa de Boulos à Prefeitura de São Paulo em 2020.

"Se os outros partidos de esquerda tiverem uma candidatura com um programa de esquerda, a nossa pré-candidatura perde força, o que nos leva a abrir diálogo", analisa o deputado. "Mas, se for uma candidatura para conquistar setores da direita, aí a nossa tese de candidatura própria vai se fortalecer."

Oficialmente, o PSOL só debaterá os rumos eleitorais em seu congresso geral, marcado para setembro. Boulos não quis comentar o cenário de enfrentamento, mas tem negado que sua posição seja a de adesão automática a Lula. Para ele, tudo dependerá do tipo de acordo que estiver em jogo.

Alinhado a Boulos, o presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, afirma que ​a orientação aprovada pelo diretório da sigla é no sentido de "construir a unidade das esquerdas".

"Isso não significa necessariamente que o PSOL irá compor alguma aliança. Essa questão será debatida democraticamente no congresso nacional, considerando o quadro como um todo e a situação dos partidos de esquerda", diz o dirigente, que tem sido discreto para não acirrar ainda mais os ânimos.

No tucanato, que vive algo próximo de um plebiscito para ratificar ou não a pré-candidatura de Doria, a divisão é algo histórico. As prévias, em novembro, também devem contar com o governador Eduardo Leite (RS), o senador Tasso Jereissati (CE) e o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio (AM).

"Partido é para isso, para ter disputa. Lá na frente a gente encontra uma convergência. É assim que se estabelece a democracia", diz o presidente nacional do PSDB, Bruno Araújo. "Nós não somos 'unido', somos 'partido'", brinca.

Para o dirigente, os debates internos fortalecerão a base da sigla e terão interferência nula no esforço para romper a dicotomia Bolsonaro-Lula, que envolve agremiações como o próprio PSDB, o DEM e o Novo. "Para ir para o entendimento, precisamos de alguém que personifique o partido", diz Araújo.

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João Doria, Eduardo Leite, Tasso Jereissati e Arthur Virgilio, que são os possíveis presidenciáveis do PSDB - Divulgação

O DEM, que trabalha com o nome do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, também busca uma solução para unificar a legenda, que implodiu após a eleição para a presidência da Câmara dos Deputados e vem perdendo quadros importantes, em meio a confrontos de caciques.

"No momento certo vai se oficializar a pré-candidatura, de forma organizada. Não tem que ser agora", contemporiza Mandetta. "Todos os partidos têm as suas peculiaridades e complexidades. É natural que haja pessoas com diferentes visões, mas isso vai se depurando, vai clareando."

Outro nome do DEM, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG), também é mencionado nas listas de presidenciáveis, mas como um projeto do presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, que gostaria de ver o senador disputando a cadeira por sua legenda. Pacheco, até aqui, rechaça a hipótese.

No caso do PDT, que está na corrida presidencial com a pré-campanha de Ciro Gomes, a fratura até agora se apresentou não na forma do lançamento de outra pré-candidatura, mas na discordância com a estratégia do ex-ministro de atacar Lula para acenar ao público mais à direita.

Em entrevista à Folha, o deputado federal Túlio Gadêlha (PDT-PE) disse que o alvo deveria ser o atual mandatário, em vez do petista. "Ciro não vai conquistar os votos de [eleitores de] Bolsonaro. Ele pode conquistar os votos dos 40% de indecisos, e para isso não precisa atacar Lula."

Ciro gosta de falar que sua candidatura é uma questão pacificada no PDT. Para o presidente nacional da legenda, Carlos Lupi, as queixas sobre a postura contrária a Lula são isoladas. "É direito de cada um questionar. Mas Ciro faz a crítica substantiva, pontua diferenças programáticas e aponta erros", diz.

Partidos se dividem nas definições sobre 2022

  • Novo Anunciou pré-candidatura de João Amoêdo, deputados federais tentaram emplacar Tiago Mitraud, e Amoêdo resolveu desistir
  • PSOL Glauber Braga se lançou pré-candidato para fazer frente à possibilidade de a sigla abrir mão de ter candidato próprio e apoiar Lula
  • PSDB Tem prévias agendadas para novembro, com disputa entre João Doria, Eduardo Leite, Tasso Jereissati e Arthur Virgílio
  • DEM Trabalha com a pré-candidatura de Luiz Henrique Mandetta e vê Rodrigo Pacheco ser assediado para sair candidato pelo PSD
  • PDT Ciro Gomes não enfrenta outra pré-candidatura interna, mas estratégia de criticar Lula desagrada a parte dos correligionários
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