Dia #91 - Sexta, 12 de junho. Cena: lembrando que o último show que vi foi no final de fevereiro, na concorrida sala Razzmatazz, agora mesmo fechada “até novo aviso”, com a banda de marchinhas-techno-eletrônica alemã Meute.
Aqui, lá e acolá neste planetazul que ora habitamos, todos estamos verde-amarelo de saber que a cultura "presencial" sofreu —e vem sofrendo— com a pandemia.
Durante o confinamento, a música ao vivo deixou de existir como a conhecemos e se transferiu para lives, redes sociais e varandas de apartamentos. Massa, novas possibilidades (e pouco dinheiro), coisa linda.
Mas, agora —ou em breve— é hora de voltar à rua. E vem então a pergunta ululante entre músicos, produtores, programadores, técnicos e donos de espaços culturais dos quatro cantos deste nosso mundo coronado: como?
Pois um coletivo aqui em Barcelona está criando um saudável frisson no combalido ecossistema cultural da cidade, com uma proposta que busca recuperar o setor por meio da união entre os pequenos.
Com o apoio da prefeitura e da Associação de Salas de Concertos de Barcelona, o projeto Sala Barcelona vai tomar o castelo de Montjuïc, um dos cartões-postais da cidade, para um ciclo de 60 shows entre julho e agosto, auge do verão.
O objetivo principal é ajudar a devolver a graça da vida cultural a uma das cidades mais culturalmente agitadas do mundo e, principalmente, arrecadar fundos para apoiar os pequenos espaços de shows, em especial aqueles que perigam fechar devido ao nocaute econômico da crise.
Atualmente, a esmagadora maioria das casas de shows da cidade permanece fechada –algumas, inclusive das mais bacanudas, sem previsão de retomar suas agendas. As fases 2 (50% do país) e 3 em que se encontra Espanha impõem tantas regras aos negócios que, falando de um contexto onde impera a muvuca por excelência, muitos não veem a reabertura como algo possível antes do fim da tal desescalada, quando então os limites de lotação e outros paranauês serão afrouxados —um pouco.
"Voltar a programar em julho, quando as limitações nas salas ainda inviabilizarão muitos concertos, é reativar a atividade dos artistas, o pessoal técnico e auxiliar, os gerentes, as empresas de som e luzes, os programadores, fotógrafos e todos os profissionais que intervêm na criação de um concerto", explica o coletivo.
Na programação, bandas independentes de todos os estilos, com preferência para a cena local (porque, né). Cada show acontecerá no Pátio de Armas do castelo e terá lotação máxima de 400 pessoas —por ser ao ar livre, porque em espaços fechados o máximo é quase um décimo disso—, com entradas de 12 a 15 euros (R$ 68 a R$ 85).
Entradas e saídas serão cuidadosamente sinalizadas, e o público deverá movimentar-se por corredores e por turnos. Haverá álcool em gel por toda parte e regras estritas sobre o uso da máscara até o momento de o ciudadano achar seu lugar na plateia. Todos sentadinhos, em grupos de no máximo oito pessoas.
A prefeitura de Barcelona embarcou no projeto com 165 mil euros (R$ 936 mil), e os restantes 85 mil (R$ 482 mil) necessários para inteirar a proposta serão bancados pela bilheteria, venda de bebidas e patrocínios.
O barcelonês adora shows. A cidade é parte-estrela da rota europeia de turnês e festivais. Muitos, cancelados neste ano, inclusive os famosos Sónar e Primavera Sound.
Nada como subir a montanha (o castelo, erguido no século 17, está aboletado no alto de uma colina em um miauravilhoso parque, e abriga diversos outros eventos culturais durante o verão, como mostras de cinema ao ar livre) e unir-se a uma civilizada e solidária matilha para apoiar a cultura.
"As salas de concertos de pequena lotação são espaços culturais fundamentais para o crescimento dos artistas e de suas carreiras, uma peça-chave do tecido, valiosa, mas vulnerável, e que devemos potencializar e proteger", professa a apresentação do projeto. Entrando na web para reservar minha entrada em 4, 3...
“Músicas para Quarentenas” podem ser escutadas aqui.
DIÁRIO DE CONFINAMENTO
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Dia 1: 'Não estamos de férias, mas em estado de alarme'
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Dia 2: 'Teste, só para pacientes internados'
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Dia 3: 'A vida vista de cima'
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Dia 4: 'Panelaço contra o rei'
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Dia 5: 'O perigo mora em casa'
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Dia 6: 'Solidariedade em tempos de vírus'
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Dia 7: 'O lado utópico da crise'
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Dia 8: 'O canto dos pássaros urbanos'
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Dia 9: 'Os de baixo ficam sem banquete'
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Dia 10: 'Essa desproteção vai cobrar fatura'
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Dia 11: 'Se não estamos no pico, estamos muito próximos'
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Dia 12: 'Tensão cresce em diferentes setores'
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Dia 13: 'Único tratamento agora é a disciplina'
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Dia 14: 'Os domingos são como segundas, e as segundas como domingos'
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Dia 15: 'Cada incursão ao exterior é uma operação de guerra'
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Dia 16: 'Começam a proliferar os vigilantes da lei entre os cidadãos'
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Dia 17: 'Tem chovido muito nestes dias em Barcelona'
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Dia 18: 'Tem chovido muito nestes dias em Barcelona'
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Dia 19: 'A vida vai registrando uma sucessão de recordes negativos'
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Dia 20: 'Come chocolates, pequena'
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Dia 21: 'Com avanço da crise, aumentam a tensão e as divergências'
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Dia 22: 'Separados por confinamento, casais marcam encontro no supermercado'
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Dia 23: 'Independentemente da duração, todos sabemos o que é uma quarentena'
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Dia 24: 'A manhã começou com um tutorial japonês maravilhoso sobre tofu'
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Dia 25: 'Espanha testará 30 mil famílias'
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Dia 26: 'Hoje deu vontade de ver o mar'
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Dia 27: 'Perspectiva é de que quarentena tenha prorrogação-da-prorrogação'
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Dia 28: 'E eu, sou não-essencial?'
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Dia 29: 'Qual é a importância das pequenas coisas?'
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Dia 30: 'Após um mês, os espanhóis (alguns) voltam às ruas'
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Dia 31: 'Não há ninguém para colher cerejas'
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Dia 32: 'Queremos pedir que você busque outra casa'
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Dia 33: 'Sobre política e pardais'
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Dia 34: 'As mandíbulas de Salvador Dalí'
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Dia 35: 'Escola, só no ano que vem'
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Dia 36: 'A Nova Normalidade'
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Dia 37: 'A dor é temporária; o orgulho é para sempre'
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Dia 38: 'O início da reconstrução'
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Dia 39: 'O elaborado ritual do passeio em família'
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Dia 40: 'A cidade mascarada'
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Dia 41: 'Um Dia dos Namorados diferente'
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Dia 42: 'Sair, sim, mas com separação de brinquedos'
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Dia 43: 'Tínhamos que tomar decisões duras e rápidas'
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Dia 44: 'A cidade das crianças'
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Dia 45: 'Isso não acabou'
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Dia 46: 'Quatro etapas para o verão'
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Dia 47: 'As piedras no caminho'
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Dia 48: 'O jeito luso'
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Dia 49: 'As novas regras do rolê'
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Dia 50: 'Sobre crânios e crises'
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Dia 51: 'Um dia inesquecível'
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Dia 52: 'Começa o descofinamento'
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Dia 53: 'O comandante e as ovelhas'
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Dia 54: 'Confinados por um fio'
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Dia 55: 'O calor e o jogo do contente'
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Dia 56: 'A Barcelona de mil caras'
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Dia 57: 'Redescobrindo o amor'
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Dia 58: 'Espanha avança pela metade'
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Dia 59: 'O voo da discórdia'
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Dia 60: 'O ano que não houve'
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Dia 61: 'Passando de fase'
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Dia 62: 'Sobre manifestações e cabeleireiros'
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Dia 63: 'San Isidro com flores e máscaras'
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Dia 64: 'Dá medo, medinho, medaço'
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Dia 65: 'Máscaras e luvas jogadas na rua'
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Dia 66: 'Quentinhas de luxo'
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Dia 67: 'Brasil para espanhol ver'
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Dia 68: 'Parecia Copacabana'
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Dia 69: 'O passinho do lagarto'
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Dia 70: 'As pessoas meio que gritam entre si'
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Dia 71: 'O augúrio chinês'
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Dia 72: 'Estamos enlouquecendo?'
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Dia 73: 'Nazaré confusa e fila pra cerveja'
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Dia 74: 'Enquanto julho não vem'
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Dia 75: 'Contemplemos, meditemos, recordemos'
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Dia 76: 'A fábula do terrorista e da marquesa'
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Dia 77: 'O informe da discórdia'
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Dia 78: 'Lições da cólera em tempos de coronavírus'
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Dia 79: 'Nos deram um pouco de liberdade e agimos como se o vírus não existisse'
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Dia 80: 'Sem pressa, mas sem pausa'
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Dia 81: 'Botellones, a nova discoteca pós-Covid'
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Dia 82: 'Pandemia, crise e racismo'
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Dia 83: 'Sair da UTI para ver o mar'
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Dia 84: 'A senhora deu positivo e deve se isolar imediatamente'
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Dia 85: 'A verdade é que é uma incerteza para todos'
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Dia 86: 'A cultura de bar na Espanha é expressiva'
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Dia 87: 'Todo cuidado é pouco e, inclusive, pode não ser suficiente'
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Dia 88: 'O vírus segue sendo uma ameaça'
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Dia 89: 'O fogo que nunca se apaga'
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Dia 90: 'Uma bolha, uma família'
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Dia 91: 'Músicos do mundinho, uni-vos'
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Dia 92: 'Como um clube de jazz dos anos 1930'
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Dia 93: 'Dinheiro pode estar com os dias contados no pós-pandemia espanhol'
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Dia 94: 'Uma vida de mil e uma regrinhas'
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Dia 95: 'Cada dia, ao chegar em casa, me isolava da minha família'
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Dia 96: 'Abraços, mesmo que de plástico'
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Dia 97: 'Em casa com o agressor'
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Dia 98: 'Já vivemos como podemos, e não há mais'
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Dia 99: 'O ídolo pop e as amêndoas'
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